A crise financeira do Estado deixa dúvidas sobre a continuidade de inúmeros projetos sociais e culturais. Um deles é a rede de Bibliotecas Parque. No início de dezembro, todos os funcionários receberam aviso prévio. As unidades do Centro, Rocinha, Manguinhos e Niterói também passaram a operar em horário reduzido. As medidas foram tomadas diante das incertezas quanto às atividades em 2017, com as mudanças de governo nas Prefeituras do Rio e Niterói, que oferecem aporte financeiro ao projeto, e o encerramento do contrato da organização social (OS) gestora do projeto, o Instituto de Desenvolvimento e Gestão (IDG). Moradores e funcionários das áreas afetadas fazem protestos para tentar afastar a possibilidade.
Com uma média de 1.500 visitantes por dia e 153 funcionários, a rede de Bibliotecas Parque foi inaugurada em 2010 durante o Governo Cabral e é gerida desde 2014 pelo IDG. Elas foram criadas em áreas estratégicas de vulnerabilidade social do Rio como forma de combater a violência e estimular a cultura local. A unidade Manguinhos foi a primeira a ser inaugurada, em 2010, e conta com cinema, biblioteca, salas de leitura, espaço multimídia, ludoteca e cineteatro. Aberta em 2012, a BP Rocinha – C4 possui cinco andares com DVDteca, cineteatro, sala multiuso para cursos, estúdio de gravação e edição audiovisual, espaço de internet comunitária (com 48 computadores e 12 notebooks), cozinha-escola e café-literário.
As dificuldades do Governo Pezão, que decretou estado de calamidade nas contas públicas há cerca de dois meses, ameaçaram no início do ano as atividades das BPs, mas a Prefeitura do Rio de Janeiro assumiu o custeio delas ainda na gestão de Eduardo Paes. Segundo contrato firmado, a Prefeitura repassa mensalmente R$1,5 milhão para manutenção das três unidades do município. A parceria entrou em vigor em janeiro de 2016 e o contrato de R$18 milhões vai até dezembro deste ano. As mudanças na Prefeitura são mais um capítulo no drama, já que a Secretaria Municipal de Cultura do Rio (SMC) afirma em nota que “a decisão de renovação ou não do contrato cabe à próxima gestão”.
Moradores e funcionários protestam contra o fim das BPs
Enquanto se mantém o clima de indecisão, funcionários e frequentadores das bibliotecas vêm organizando protestos. O último aconteceu nesta sexta-feira (09), quando moradores da Favela de Manguinhos se reuniram na sede da BP local para demonstrar apoio à permanência do projeto. A moradora do PAC de Manguinhos e estudante do grupo de teatro Manguinhos Em Cena Telma, 39, era uma das mais abaladas com a possibilidade de fechamento das portas:
– Eu tenho muito amor pela biblioteca, onde eu aprendi muitas coisas, até mesmo desenvolver a leitura, pois não tinha o hábito de ler. Esse lugar marcou muito a minha vida. Eu nunca havia pisado em um teatro antes. Foi um sonho realizado e muita gente só conheceu o teatro graças à Biblioteca Parque de Manguinhos.
Uma frequentadora, que preferiu não se identificar, lembrou da importância de um aparelho de cultura como a Biblioteca Parque como forma de inclusão social: “Cada jovem que se envolve com dança, cinema e teatro deixa de se envolver com coisas ruins. Isso aqui não é de graça, todos nós contribuimos com nossos impostos. Não é favor”. Um dos manifestantes concordou: “Nós somos contra essa política de maldades, de desmanche de formas de resistência. As bibliotecas, teatro e cinema curam o Rio do Caveirão e das mazelas da cidade”.
Em comunicado, a rede de Bibliotecas Parque avisa sobre sua mudança de horários de funcionamento das unidades até o dia 30 de dezembro. Nas unidades Manguinhos e Rocinha, o novo horário é das 10h30 às 16h30h. No Centro e em Niterói, os atendimentos acontecem das 11h às 17h. As unidades não funcionarão nos dias 24, 25 e 31 de dezembro.
– Continuamos as atividades, apesar de todo esse contexto, afirma um dos funcionários, que também não quis se identificar.
Em nota, a Secretaria de Estado de Cultura do Rio de Janeiro afirma que a intenção do governo é manter os contratos firmados com as Prefeituras do Rio e de Niterói, que repassam as verbas necessárias à manutenção das BPs, mas que precisa respeitar o tempo dos trâmites burocráticos. Para evitar o fechamento provisório das bibliotecas em janeiro, a SEC/RJ negocia com a Fecomércio um aporte de R$ 1,5 milhões. Procurada pela equipe de jornalismo da ANF, a Fecomércio não se manifestou até o fechamento desta matéria. A assessoria do prefeito eleito do Rio Marcelo Crivella confirmou interesse em manter o convênio com as Biliotecas Parque, “que são um importante equipamento cultural e de educação para centenas de pessoas”.
Colaborou Bruno Machado.