Empoderamento, protagonismo, orgulho, raça: a III Marcha das Mulheres Negras no Centro do Mundo levou milhares de mulheres negras de todas regiões do Rio para Copacabana neste domingo, 30. Quilombolas, militantes, artistas, religiosos, trabalhadoras e estudantes compareceram ao evento, que começou às 9 h da manhã e só terminou depois das 20 h com feira de empreendedoras e uma roda de samba comandada pelo grupo feminino Só Damas.
Ônibus e vans trouxeram comitivas de todo canto. Entre grupos e organizações, também estavam famílias inteiras. A participação masculina foi apenas no apoio ao ato – o dia era delas. O evento seguiu tranquilo, com palavras de ordem e perfomances. Um dos momentos mais emocionantes foi quando empregadas e babás que estavam no prédios à beira-mar foram para as janelas acenar para marcha, recebidas com aplausos e solidariedade. “Lugar de mulher preta é em todos os lugares!”, bradava o carro-de-som que comandava a passeata.
Julio Barroso: ‘Todo o poder para a mulher negra’
Com as Yalorixás sempre à frente abrindo os caminhos, a Marcha das Mulheres Negras lembrou algumas injustiças que entraram para a história recente, como a saída da cadeia da ex-primeira-dama Adriana Ancelmo, acusada de fazer parte de esquema de pagamento de propina que desviou milhões dos cofres públicos e que contrasta com as milhares de mulheres negras que têm o direito de estar perto de seus filhos negado pela mesma Justiça que lhe concedeu liberdade.
– Eu espero, com a força dos Orixás e dos nossos irmãos, que essa luta tenha um fim legal. Que nossos filhos possam caminhar tranquilamente pelas cidades, ir tranquilamente aos shoppings e estudar. A maior preocupação de uma mãe negra é quando seu filho sai para onde for, seja para estudo ou para trabalho. Nós morremos um pouquinho em nossas casas só pensando que eles podem sofrer uma agressão, uma bala perdida. O racismo é muito cruel, o racismo mata, afirma a cantora Tia Rosa, moradora do bairro Santa Rita, em Nova Iguaçu.
Estavam presentes as mulheres negras de Itaboraí, município que sofre com a interrupção das obras do Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro, paradas desde o início da crise do Estado em 2014: “Somos do município do Comperj, que deixou muitas mulheres desempregadas. Hoje, nós estamos marchando pela dignidade desse povo que vive lá. Não sabemos quando voltam (as obras)“, explica a presidente do Fórum Permanente de Mulheres Edinéia Nascimento.
A luta pela liberdade de Rafael Braga, único preso das manifestações de 2013, ganhou amplo destaque na III Marcha das Mulheres Negras no Centro do Mundo. Rafael hoje enfrenta uma acusação de tráfico de drogas que, segundo ele, teriam sido plantadas por policiais na Vila Cruzeiro, onde vive sua família. Algumas personalidades femininas da política também marcaram presença, como a ex-secretária municipal de cultura Jandira Feghali e a primeira governadora negra do Estado do Rio Benedita da Silva, que a todo o momento era ovacionada.
– Hoje é nossa realização, de tudo que nós, mulheres negras, estamos construindo no país. A marcha é pela nossa realização, pelo nosso bem-viver e pelas trabalhadoras do Estado aposentadas que estão sem receber seus salários. A marcha é contra o extermínio da comunidade negra, afirma Lenir Claudino, a Leninha, da Secretaria de Gênero e Raça do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde, Trabalho e Previdência Social do Estado do Rio de Janeiro (Sindsprev-RJ).
A organização estima que a Marcha das Mulheres Negras levou mais de dez mil pessoas para a Zona Sul do Rio. O evento superou as expectativas.
– Foi um sucesso absoluto. Estamos aqui contra o racismo, a intolerância religiosa, contra a lesbofobia, feminicídio negro, o genocídio negro, contra todo tipo de preconceito sofrido diariamente pela população do Rio de Janeiro, em especial as mulheres negras. Já vamos começar a construir nossa quarta marcha. Vamos marchar todos os dias para dizer não a este governo golpista, resume Ignez Teixeira, uma das organizadoras da marcha e membro do Fórum Estadual de Mulheres Negras do Rio de Janeiro.