Um provável exagerado escreveu na internet “daqui a cem anos ainda haverá gente lembrando o que Messi fez no Qatar”. De fato, convenhamos que ele fez muito em campo, deu o tricampeonato à Argentina, mas Garrincha deu o bi ao Brasil no Chile em 1962 e quase ninguém se lembra 60 anos depois. O que penso passar na cabeça das pessoas mais antenadas na vida brasileira do que o comentarista distraído do início do texto é a extrapolação do futebol para a política e para a personalidade de cada pessoa disponível na cena.
Lionel Messi nasceu em 1987, tem hoje 35 anos e presume-se que tenha disputado a última Copa do Mundo de sua bela carreira. Kylian MBappé está prestes a completar 24 anos antes do Natal e tem várias copas pela frente. O mesmo se pode dizer de Neymar Jr. Era, assim, a copa de Messi, como dizem por aí, e o Brasil só não torceu maciçamente pela Argentina na final porque toda unanimidade é burra, dizia já dizia Nelson Rodrigues. Os detalhes, as razões desta torcida declarada ou tácita são nítidasa e estão nas diferenças entre os três. MBappé provocou o adversário dias atrás ao afirmar que o futebol sul-americano está mais atrasado que o da Europa, e poderia ter lembrado os daqui que jogam lá, mas preferiu apontar a quantidade de copas do mundo recentes ganhas por seleções da Europa. A provocação custou caro.
Também na contramão dos fatos, Neymar Jr disse ao presidente Jair Bolsonaro que seria reeleito e que o Brasil ganharia a Copa. Errou as duas previsões, mas poderia ganhar a vida como adivinho de televisão, considerando-se que todos erram redondamente seus vaticínios e mantêm a cara de pau todo fim de ano. O que interessa, no entanto, não é o futuro de Neymar Jr, garantido pelos gordos rendimentos dentro e fora das quatro linhas. O duro é que Neymar Jr errou feito na eleição e colou sua imagem na de Bolsonaro, o derrotado da hora no Brasil. Não precisava, mas o nosso craque ainda afirmou que levaria a taça para o presidente ver.
Voltando a Messi, ele foi humilde e saiu da improvável derrota para a Arábia Saudita na estreia no Qatar para a gloria da conquista do titulo de campeão no domingo contra a França do europeu superior, segundo MBappé. Aliás, o argentino e o francês mantiveram a provocação no nível da grama, não ousaram subir a tribuna de honra dividir o prêmio com nenhuma autoridade. França e Argentina não misturam as coisas, como acontece no Brasil, aqui por qualquer bobagem saímos para o racismo, a misoginia, o machismo, as fobias mais variadas e sortidas. Por isso, um energúmeno como Neymar Jr anuncia que vai ganhar a copa e levar o troféu para Bolsonaro ver, contrariando pelo menos a metade mais um torcedor do Brasil.
E a gente, o distinto público que sofreu os jogos da seleção no Qatar, tem de ouvir tudo calado e ainda se dar por satisfeito com a Croácia por ter abreviado nossa disputa. Daqui a quatro anos, Neymar Jr e MBappé estarão prontos para outra Copa, que Messi assistirá como convidado da Fifa. Tomara que nosso menino marrento não faça a bobagem de prometer a vitória e a taça ao Lula.