Pensando nos resultados das eleições, nesse último domingo, no Brasil, lembrei de uma aula de Aza Njeri. Ela dizia que “Quando estamos vendo o jogo sendo jogado, sem entender nada, somos a bola”, mais ou menos isso. Nós pretos, que somos a maioria, estamos permitindo que candidatos assumidamente racistas sejam eleitos, e com recordes de voto.

Um candidato que se declarou contrário às cotas, por ser branco, foi o mais votado em São Paulo, a exemplo de Lucas Pavanato, do PL, que defende, também, a proibição do aborto, a restrição do uso de banheiros femininos por mulheres trans e a investigação de ONGs que trabalham com dependentes químicos na cidade.

Eu acredito piamente que a ascensão do inominável, último ex-presidente, se deu quando a sociedade racista, cansada de ver a população preta acessando espaços de privilégios construídos para a branquitude, por meio de diversas políticas afirmativas criadas pelo governo Lula, lá no início do seu primeiro mandato, encontra um cara que expõe publicamente o que eles não têm e nunca tiveram coragem de falar.

Do outro lado, o povo preto, atônito, muitos até apoiando os desmandos dos extremistas da direita.

Estamos vivendo tempos sombrios. Tempos de ataque à democracia, retrocessos, direitos garantidos por lei, sendo retirados por diversas propostas de emendas à Constituição.

Acredito que desde a chegada do primeiro cargueiro negro, temos sido a bola desse jogo e, ainda, não conseguimos nos dar conta desse fato. A maioria não consegue mesmo.
Em um país onde a maioria é composta por mulher e mulher preta, as pessoas negras não votam em Mulher preta.
Somos apenas 2% do Congresso Nacional e menos de 1% na Câmara dos Deputados. Um escárnio!
O racismo provoca esse comportamento contraditório, nos adoece.
Ele fere a nossa subjetividade de tal forma, que muitos ainda continuam alimentando o sonho de estar na “casa grande” ao invés de sonhar com a libertação e soberania dos nossos.
Como se não fossem suficientes, todas as barreiras conferidas pelo racismo, assistimos a aprovação da PEC 09/2023, a lei que anistia os partidos que não cumpriram cotas para mulheres e negros. Um total retrocesso a inclusão e igualdade política .

Movimento Negro Unificado-RJ


Felizmente, vimos também o incessante trabalho de diversos movimentos e coletivos, como por exemplo o Movimento Negro Unificado RJ, e Mulheres Negras Decidem, em prol da inclusão de mulheres negras na política.
Façamos um grande reflexão, sobre tudo nós enquanto mulheres negras periféricas , precisamos lutar contra o racismo diariamente para garantirmos uma vida digna, precisamos nos apoiar e garantir que as nossas iguais acessem espaços de poder e decisão.
Se todo o poder emana do povo, por intermédio dos seus representantes, onde está o poder do povo preto? E até quando seremos a bola?

Precisamos refletir sobre quem estamos empoderando!

Aza Njeri é professora doutora em Literaturas Africanas e pesquisadora de Filosofias, Culturas, Literaturas e Artes africanas e afro-diaspóricas