Hoje acordei cedo e fui pro campo de futebol aqui da área, enquanto minha preta ia para a igreja. O time da comunidade ganhou, que bom isso não é sempre que acontece. Sai do campo fui pra casa curtir meus filhos que não saem do celular. Nunca vi jogar tanto. O dia passou rápido, se não fosse pelo calendário, nem teria notado que hoje é dia da mulher. Nada na comunidade lembrava, as muitas lutas travadas pelas mulheres que povoam esse canto de mundo, nada. Uma senhora embriagada no bar da Terezinha, quase não mulher-negra-resistenciaconseguia parar em pé. Ajudei, dei uma cadeira a ela, mas uma vizinha foi além e a levou para casa. Após beber umas e outras com meu irmão, após debater racismo, preconceito e uma gama de assuntos, resolvi ir para casa. Não sem antes notar os olhares desconfiado dos nordestinos que se multiplicavam naquele pedaço de chão. Imagino que estravam minha postura e maneira de agir. Negão que não aceita ser chamado de macaco, que não fica rindo o tempo todo e esta sempre com um discurso politizado nos lábios. Não é comum eu sei, todavia é uma forma de sobrevivência. Ser preto no morro exige certas posturas, exige coerência de raciocínio e principalmente discernimento, afinal o inimigo pode ser qualquer um. Pode ser um policial negro ou branco, um bandido negro ou branco ou simplesmente um pela saco invejoso que não pode ver preto com nada que logo encontra um motivo para implicar. Pois é, na favela o preto também não tem direito, pelo menos se for trabalhador. Se for bandido ai é outra história. Sai do barzinho e fui caminhando pelo pistão, rumo a minha casa. Após alguns passos vi um carro preto passar com um maluco todo alterado gritando algo que não deu para identificar, logo depois via alguns policiais sinalizando e pedindo para parar o carro. Alguns minutos depois cheguei até o local, um jovem negro estava imobilizado no meio de uns dez o mais policiais. Me aproximei a tempo de ver um daqueles PMs dar um tapa na cara de uma mulher que protestava, tentei ligar o celular para filmar mas já era tarde. No meio do tumulto e da gritaria ainda foi possível ver o rapaz ser imobilizado com a arma de choque. Tudo desnecessário e corriqueiro, normal para quem vive e convive com a violência do estado todos os dias. O dias das mulheres pra mim terminou assim com uma cena de um PM atacando a tapas uma mulher que poderia muito bem ser a sua mãe.

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Prettu Junior
Rapper, escritor e ativista da cultura hip hop, no Rio de Janeiro. Participou efetivamente de iniciativas de delegações brasileiras que participaram na III Conferência Mundial contra o racismo, a xenofobia e formas correlatas de intolerância promovida pela ONU, em Durban, na África do Sul. Participou também do fórum social mundial, nos anos de 2002 e 2003, em Porto Alegre, no qual teve a oportunidades de desfilar seus versos e rimas recheados de críticas sociais. Foi um dos protagonistas na criação da iniciativa “fórum das periferias”, no Rio de Janeiro, que infelizmente não se realizou por completo. Fez shows e apresentações em várias partes do Brasil, América do Sul e Central.