Eu não sei o que eu sou. Talvez, seja uma grande arma para a sociedade, já que sei mais nomes de armas do que de livros e não tive outras chances. Sou um pedaço de carne perdido na multidão, e não sei pra onde ir. Pedras no caminhos? Guardo todas e um dia vou construir a minha morte. As pessoas não olham pra mim. Será porque eu sou invisível? Será que eu sou alguma espécie de super-herói que se instalou no sistema? Não tenho educação, mas tenho ação, e hoje usei umas pedras, funguei com força para que a fome passasse. O que é pior: chegar no fundo ou continuar caindo?
No meu mundo tem música, mas não são anjos que cantam. Eu me perco entre o choro da minha mãe, dizendo que o amanhã pode não existir para mim. Eu queria ser craque no Flamengo e beijar o escudo fazendo um gol no Maracanã. Mas faz tempo que nem beijo de mãe eu ganho. Aliás, minha mãe me jogou pro mundo, e eu tive que driblar toda essa raiva que sinto, quando parece que eu vou morrer pelo simples fato de que ninguém se importa. Tamo eu e meus demônios, como sempre em estado desumano; 2016 e nada mudou dessa vez.
Sensação de poder, excitação, hiperatividade, insônia, intensa euforia e prazer. Tudo acaba no dia seguinte e eu preciso usar novamente. Meus dias estão contados e só vejo meus amigos sem luz na sombria multidão de pessoas sem coração que nunca olharam nos meus olhos. Não sei por que estou contando a minha história, nem estatística sou mais. Conto nos dedos as pessoas que saíram vivos dessa droga de vida!
Minha idade? O suficiente para já estar cansado e exausto por lutar em vão nessa vida, só para ter direito a ela e me sentir um vivo. Se eu recebi algum abraço hoje? Abraços são para pessoas que te dão afeição, e eu apenas existo por existir. Sou saúde pública e ninguém vê. Estou em condições miseráveis, não tenho casa, não tenho nada. O crack não me deixa dormir. Sonhar pra quê? Sonhar o quê? Se eu acordo com o barulho dos tiros e tenho a sensação de que a bala da Glock pode vir parar na minha testa e fazer com que esse inferno acabe logo? Aliás, se isso não é o inferno, é o quê?
Sou dependente, mano.
Preciso ir.
Ass.: Ninguém.