Existe um mito sobre as periferias, fundamental para demonstrar a incompreensão generalizada sobre o que este conceito significa: a ideia de que existe “A periferia”. Sob esta visão equivocada, trata-se de um elemento uno, um espaço alocado dentro do perímetro urbano apartado da centralidade de acesso a bens e políticas públicas que fazem as metrópoles serem classificadas como tais. A dita periferia (no singular) é o lugar do não-lugar, que supostamente funciona de maneira igual, sendo marcada principalmente pela desorganização e pela carência de tudo.
O erro primordial desta conceituação já começa em número. Não se trata da periferia, mas das periferias. Assim que se acrescenta uma letrinha ao conceito, já é possível começar a redesenhar sua real ideia: as periferias não são elementos estanques, mas únicos em suas próprias realidades. Favela não é tudo igual. Periferia não é tudo igual. Cada território (especialmente, quando se trata de território popular) possui suas especifidades. Cada população possui o seu próprio jeito de se relacionar com a sua comunidade (por comunidade, entenda conjunto de pessoas, não o eufemismo midiático para áreas menos abastadas), e nessa relação influem fatores que englobam desde a produção artística local até características de clima e relevo, passando pela política não oficial e também pelos costumes.
Insistir na ideia da periferia como espaço estanque é reforçar estereótipos e as miopias que tornam ineficientes tantas políticas públicas e equívocos no relacionamento com estes territórios. Esta é uma imprecisão cometida diariamente pela grande mídia ao falar das favelas, por exemplo, e que só gera mais preconceitos. O Rio de Janeiro possui mais de 1.000 favelas em uma área de 43 mil quilômetros quadrados. Sugerir que cada uma dessas comunidades são mais do mesmo, que possuem as mesmas demandas e necessidades é subestimar o que cada área tem de especial, seja para o bem ou para o mal. A periferia não é um mundo, mas vários mundos. Cada área periférica é um universo de particularidades.
Também é preciso deixar de entender a periferia apenas como um elemento do perímetro urbano. Os problemas de uma favela não são os mesmos da população da área rural, mas ambos têm em comum o fato de estarem à parte de um território central, à margem do centro em um esquema de exclusão e invisibilidade. Viver nas periferias significa experimentar uma vivência particular em comunidade, esteja ela onde estiver – nas favelas brasileiras, nos subúrbios de Paris, nas regiões desérticas da Africa Subsariana.
A periferia é plural, mas as periferias são singulares. A periferia é única, mas não é uma coisa só.