Olhando aqui do alto do morro, vejo o caos, gritos de dor e pânico, vias em meio a assaltos e pessoas arrastadas por um turbilhão de incertezas e maus presságios. O Rio sangra, a cidade chora e o Estado segue sem rumo, sem respostas.
O morro não desce porque agora todos estão sofrendo. A impressão que tenho é que agora não há mais divisão entre o asfalto e a favela. Com os descasos governamentais, nos unimos no mesmo patamar. A violência que experimentamos aqui cotidianamente agora também é dos que vivem lá embaixo. Os sons dos estampidos agora é audível também nas vias principais da “cidade da beleza e do caos”, onde não se há mais lugar seguro. Todos agora são vítimas do descaso que foi implantado com a desorganização dos que gerenciam os recursos públicos, dos larápios que nos deixaram na sarjeta.
Na minha simplória observância, vejo os ricos acuados, a periferia sendo atingida diretamente, as forças de segurança atordoadas e uma quadrilha corrupta que continua a roubar o Estado de forma organizada. Só nos restam servidores sem comida na mesa, escolas com professores em greve, hospitais sem médicos e um desalento que invade a todos nós. Não há nenhuma luz no final do túnel, não temos um pingo de esperança.
As lutas de resistência hoje se concentram em ações pontuais, locais e de extrema necessidade, que tornam possível a sobrevivência dos que estão ao nosso redor. Assim tem sido alimentado diariamente nosso sentimento de luta nesse momento de extrema incerteza em meio a tudo que nos cerca.
Somos desafiados o tempo todo a tirar força de onde não temos, a lutar contra a fome que voltou a nos assolar de forma cruel, assim como pela falta de esperança que nos julga a cada passo que damos. Vejo pessoas cabisbaixas, circulando como zumbis à procura de um oásis a cada dia mais distante de nós. É notório que os comércios fecham as portas, o desemprego que assola, os jovens cada vez mais engrossando as fileiras da revolta social tentando se dar voz a seu grito de socorro. As nossas poucas conquistas estão sendo levadas como o vento leva a folha seca. Temos a cada dia menos forças para lutar.
No Congresso, a corja unida mostra ao vivo no horário nobre da TV que eles não têm mais nenhum medo do povo. Estão blindados com a couraça de uma Justiça cada dia mais corruptível e política. Senhores de toga os defendem em troca da manutenção de seus altos salários. O povo todo vê um presidente bandido, que trafica influência em troca de sua permanência no poder com o único intuito de nos danar.
O Brasil sangra, o povo chora, o medo vence e a morte nos ronda. Este é um país refém de corruptos que subtraem a comida da mesa de seus cidadãos, onde direitos conquistados a duras penas são jogados na lata do lixo nos tempos tenebrosos que vemo passar pelos nossos olhos.
O meu apelo é nos unamos, favela e asfalto, quem é do morro e quem mora nas áreas nobres, quem é da Baixada e quem é do interior, para que sejamos ouvidos e possamos barrar essa onda de medo e corrupção que está nos matando.
Não aguentamos mais.