Assim toca a banda: o governo Trump baixa um decreto que proíbe aos imigrantes detidos recorrer à justiça contra a deportação. Não importa se a pessoa tem filhos nascidos nos Estados Unidos, visto de residência ou green card: envolveu-se em qualquer situação policial, perdeu play boy. Um latino que vive e trabalha lá há décadas, líder de uma associação de defesa dos imigrantes, denunciou na mídia a espada de Dâmocles que Trump pendurou sobre a cabeça de todos eles. Qual o resultado? Foi preso e será deportado, claro.
Tem mais: o cidadão estrangeiro com situação regular e legal nos Estados Unidos que visitar os familiares em seu torrão natal nas férias ou no casamento da prima, terá o passaporte retido no desembarque de volta para averiguações. Ora, se o latino, polaco, judeu ou muçulmano que lá vivem e mantêm família são tratados desta forma, por que eu, que não sou casado, não me chamo Manuel nem moro em Niterói, irei ao consulado pedir visto de turista? Sei de casos de inscritos em congressos internacionais, artistas plásticos, cantores e cientistas que passaram vexame, obrigados a voltar no primeiro voo qual terroristas ou invasores do paraíso que não existe mais – se é que algum dia foi verdade.
Assim a banda toca, mas nem é novidade para descendentes de orientais que migraram em larga escala para a costa oeste e encheram a Califórnia de lavanderias e empregados domésticos desde o alvorecer do século passado. Quando os Estados Unidos entraram na segunda guerra mundial, quem tinha olho puxado virou, da noite para o dia, ameaça à segurança nacional. Muitos foram confinados em campos de concentração construídos na terra das oportunidades, e de lá acompanharam a vitória dos Aliados sobre o Eixo do qual estavam fora, embora dentro. Portinari pintou o grande painel na sede das Nações Unidas, mas não foi à inauguração porque era considerado uma ameaça comunista. Que situação kafkiana!
O Brasil, como não podia deixar de fazer, copia mesmo por osmose ou puro mimetismo a experiência norte-americana seja ela qual for, e quanto mais desumana com mais rapidez e crueldade. Um exemplo é o que ainda ocorre na fronteira com a Venezuela: sem os recursos tecnológicos e financeiros dos nossos irmãos do Norte para controlar a fronteira, organizamos milícias, descemos a porrada, tacamos fogo nas (poucas) coisas deles e os forçamos a voltar, mais precários do que chegaram.
Pouca gente do lado de cá da fronteira se preocupa com o destino deles; aliás, ninguém imagina a diferença entre imigrante e refugiado, não quer saber e tem raiva de quem sabe – tem raiva até da ONU, que deu pra se meter no processo eleitoral brasileiro, mesmo sem ter nada a ver com a nossa valente democracia conquistada com tanto suor, pau-de-arara e sangue. Tem, inclusive, uma candidata em Brasília que gravou vídeo em que defende a “demissão” da ONU pelo governo brasileiro. Duvida? Confira: [embedyt] https://www.youtube.com/watch?v=fVvqKjpyv-o[/embedyt]
Diante da situação social na remota fronteira, alguém na mesa do bar questionou, vendo o noticiário da tevê, por que o Exército não se faz presente no controle da situação, no acolhimento e no amparo aos irmãos em busca de refúgio? Nem foi necessário responder, porque a reportagem seguinte mostrou exatamente os soldados na favela carioca, em cumprimento à intervenção federal para garantir a lei e a ordem contra o crime organizado e o tráfico de drogas.
Entendeu ou quer que desenhe?