Entre tantas declarações estapafúrdias, o capitão disse há dias a uma rádio que seu projeto é fazer o Brasil voltar no tempo 40, 50 anos, o que a líder da direita francesa Marine Le Pen inclui entre os ditos “extremamente desagradáveis” que a afastam politicamente dele. De fato, qual político no mundo polarizado de hoje terá a coragem de defender a volta ao passado como forma de andar para a frente? Ao contrário do antigo adágio, Bolsonaro afirma que “pra trás é que se anda” e o distinto público aplaude sem raciocinar, apenas pelo modismo político de bater palmas para maluco dançar.
Há meio século, portanto em 1968, o Brasil vivia a Passeata dos Cem Mil, no Rio de Janeiro, contra a censura da ditadura. O movimento estudantil fervilhava, canções de protesto buscavam e encontravam espaço para exibir a revolta contra os militares que haviam tomado pela força o poder apenas quatro anos antes. Em dezembro seria assinado o AI-5, sufocando qualquer ideia de inconformismo. Bolsonaro tinha 13 anos de idade, não sabia a diferença entre espingarda e fuzil e acredito que sua declaração à emissora de rádio tenha sido mero saudosismo infantil. Seja como for, no entanto, reflete o estado de espírito do grupo que o está levando nesta campanha.
Seu vice, o general Mourão, também pródigo em declarações pra lá de desagradáveis, está mais afinado com o grupo a que me referi há pouco, assim como também outros militares que agora mesmo esfregam as mãos, ansiosos, na expectativa de galgar o poder pelo voto de seus compatriotas, uma legitimidade que o golpe de 1964 não ostentou e talvez por isso, um tanto tímido, procurou manter as aparências de uma democracia, embora trucidada. O Congresso continuou em atividade, havia eleições regulares e até mesmo a eleição dos generais presidentes por via indireta. Foi a maneira enxovalhada de mostrar ao mundo que o Brasil vivia uma democracia porque votava e elegia representantes e seus tribunais funcionavam na normalidade ou quase isso, mas aí já era detalhe que escapa aos olhos estrangeiros.
Como escapam agora outros detalhes para os que não vivem a rotina conturbada do país, como os desaforos do filho do candidato sobre um cabo e um soldado fecharem o Supremo. Isto pode passar desapercebido pelo observador de fora, mas não o caráter fascista do regime que Bolsonaro propõe. O mundo está de olhos esbugalhados e de boca aberta, não entende como o Brasil pode retroceder tão rápida e vertiginosamente a um tempo inédito, porque, afinal, não vivemos nunca um regime fascista como a Itália de Mussolini, ou mesmo as ditaduras personalistas de décadas e décadas de Salazar, em Portugal, e Franco, na Espanha. O fascismo que se quer implantar aqui com esta eleição é, isso sim, uma jabuticaba, como gosta o general vice. Daí o interesse mundial pelo que irá acontecer entre nós a partir de janeiro do ano que vem.
Voltando ao início, essa moda de bater palma pra maluco dançar leva cada dia mais público a aplaudir e o candidato fantoche a dançar cada vez mais freneticamente, soltando declarações que para muitos soam como desequilíbrio mental puro e simples. Mas ninguém se perca em ilusões: Bolsonaro é o nosso Rodrigo Duterte, o octogenário presidente que promove há dois anos um banho de sangue nas Filipinas, em nome de uma limpeza geral, dos bandidos, dos usuários de drogas, dos pobres, dos traficantes, dos infelizes…todos assassinados nas ruas por policiais recompensados em dinheiro por cada cadáver e por grupos de extermínio insuflados pela garantia presidencial de reconhecimento e impunidade.
Não se imagine que Bolsonaro é um Donald Trump tropical, nem que o Brasil é o Estados Unidos abaixo da linha do equador. Somos, no máximo, o laboratório dos Estados Unidos na América Latina. Ao contrário dos americanos, não temos a menor garantia de funcionamento das instituições democráticas, como o filho do candidato deixou patente na infeliz afirmação sobre fechar o STF. O golpe de 2016, “com o Supremo, com tudo”, pode desembocar nisso que se vislumbra, “sem o Supremo, sem nada”. A única solução é Haddad 13!