Pela manhã, o espelho me dava a notícia:
“Está gorda demais, querida!”
Já não aguentava mais essa vida
Em minutos, iniciei aquele mesmo texto:
“Hoje não choro outra vez.
Sou forte, mais alguns quilos e paro, talvez”
Me sentia impotente
Precisava dar uma resposta ao meu corpo
Me odiava e não era de hoje
No fundo, eu era só mais um peso morto
Com o tempo, cortei tudo
Só água e no máximo um suco
Balança respondeu
Essa sim era eu
Pesava 39, sensação de 110
Com os meses,
Sem força, acordava e me faltavam pés
Eu não estava bem
Agora chamava atenção
Quem sabe daquele menino da aula de Redação?
Mas não!
O professor me espiava de um jeito diferente
Nota alta do nada e um toque indecente
Só queria a minha prova
Um carinho ali, outro comentário aqui
Rotina que nem tinha mais a quem contar
Já estava difícil não me enjoar
Minha mãe dizia “deixa pra lá”
E o diretor:
“Mente é fértil pra inventar”
Não aguentava nem mais olhar,
Aquele velho, de canto de olho, a me espreitar
Em turma de 40, sozinha estava
Meus pensamentos e eu, isolada
Quando um dia surgiu um dever na lousa:
“Dia da redação”
Hora de escrever, moça!
Lápis em punho,
Uma lágrima ao papel não se opunha
Sempre parceiros de escrita
Na frente de todos eu li:
“Hoje escrevo pedindo ajuda
Coragem eu tenho de não ficar muda
Me sentia suja
Sua mão passeava na minha bermuda
Esta é minha história, turma.”
Barulho alto para a escola ouvir
Escândalo denso demais para o famoso colégio admitir
Assédio e pedofilia são crimes
Não importa a imagem de quem venha a denegrir.
Israel Sant’Anna Esteves