Se é por falta de adeus…

Jânio e Jair, dois histriônicos perdidos nos delírios do poder. Créditos- Reprodução

“Vou embora do Brasil”, teria dito o presidente Jair Bolsonaro a um “interlocutor”, segundo divulgou a Carta Capital em seu site. Curto e grosso e sem adiantar motivos nem explicações, feito um Jânio Quadros tardio, outro tachado de doido e autoritário. Fenômeno eleitoral semelhante, o primeiro grande histrião da política nacional ocupou a presidência entre 31 de janeiro e 25 de agosto de 1961. Gastou sete meses em providências esdrúxulas, tipo proibir o biquíni nas praias e as rinhas de galo nos terreiros. Gostava de ver filmes de bangue-bangue americanos no Alvorada e o adjetivo mais condescendente que lhe aplicavam era “lunático”.

Avoado sim, mas doido não. Seis dias antes de renunciar, Jânio recebeu Che Guevara em Brasília, com direito a Ordem do Cruzeiro do Sul, mas a medalha jamais chegou ao líder guerrilheiro e o episódio não passou de uma pantomima que eriçou os pelos da direita, a mesma que marchou pelas ruas há três anos contra Dilma, Lula e o PT. Com sua renúncia, Jânio quis dar um golpe de mestre, acreditando que não o deixariam ir. Pensava ter apoio nos poderes da república e nas forças armadas. Ledo engano.

Jair Bolsonaro repete Jânio Quadros em algumas facetas, embora sem conhecimento disso. A preocupação com os costumes, a ladainha do combate à corrupção e a paranoia do poder, por exemplo. Como o antigo presidente, vê conspirações e conspiradores por toda parte, tramam sua destituição desde o general vice-presidente ao taifeiro que serve o café pela manhã – um inferno! A diferença é que Jânio cercava-se de fieis colaboradores civis, e Bolsonaro está num ninho de serpentes militares peçonhentas e graduadas. Até seu porta-voz é general, enquanto ele é um reles tenente que virou capitão quando foi para a reserva.

Jânio governava através de bilhetinhos aos ministros, Jair pensa governar por tuítes disparados aos seus seguidores. Jânio tinha o mesmo olhar perturbado e o desleixo pessoal de Bolsonaro. Mentia com convicção, tal e qual o nosso presidente, mas há uma diferença: era culto, letrado, advogado, e por estas qualidades sabia o significado do cargo, coisa que o outro desconhece, pelas declarações desastrosas dentro e fora das fronteiras.

Por falar em fronteiras, Jânio inaugurou a política externa independente que despertou a inteligência norte-americana à necessidade de fazer a cabeça dos militares brasileiros com cursos, visitas, manobras conjuntas, acordos e intercâmbios para acabar com o exotismo de condecorar revolucionário cubano, onde já se viu?! O chanceler de Jânio foi Afonso Arinos de Melo Franco, autor da primeira lei a tipificar o crime de racismo no país, em 1951. O ministro atual é Ernesto Araújo, indicado pelo Olavo de Carvalho. Não sabe nem fazer hambúrguer na chapa.

Como Jair Bolsonaro parece mas não é Jânio Quadros, soa entranha sua ameaça de deixar o país, mais uma pirraça presidencial, birra por qualquer motivo. Para onde iria quem propõe a repatriação dos refugiados aos seus países? Onde se adaptaria quem comeu numa churrascaria brasileira em Osaka, no Japão? Com quem manteria contato, trocaria mensagens, falaria ao telefone, quem ouviria suas piadas de mau gosto sobre mulheres, gays, tamanho do pinto? O interlocutor a quem fez a confidência lhe teria perguntado quem levaria para a ilha deserta. “Vou eu e minha mulher, só. Sou hétero, porra!” O estilo é o homem.

Verdade ou bravata, proponho desde já a criação de um comitê nacional de democratas de todas as colorações partidárias para, em corrente de oração, pensamento positivo e muita manifestação de rua, ajudar Bolsonaro a cumprir sua palavra. E mais: que vá com os filhos e o Queiroz para o novo endereço. Sugiro, inclusive, que a data da partida seja incluída no calendário cívico nacional. Se 9 de janeiro de 1822 marcou na história o Dia do Fico de D. Pedro I, ela marcará na folhinha o Dia do Adeus, do Fui!, do Xô!, do Vade Retro!, qualquer coisa assim. Estou aberto a sugestões…