Entre 6 e 8 de setembro, a comunidade do Bode, no bairro do Pina, zona sul de Recife, recebeu a oitava edição do Pão e Tinta, evento de arte urbana que visa levar cultura, arte, lazer e diálogo para dentro da periferia. A atividade se deu a partir da realização de mutirões sociais, intervenções artísticas e apresentações culturais, a fim de problematizar uma nova concepção de cidade e a quem, de fato, a cidade interessa.
Este ano o evento chegou à sua oitava edição, com o nome “Corpos em Alvo”, reivindicando o direito à cidade, à dignidade e à representatividade pela população periférica. Traz este ano uma manifestação acerca do terreno do antigo aeroclube, que, segundo a comunidade, deveria ser destinado para a construção de habitação social, visando retirar as mais de mil famílias que ainda moram em palafitas na região.
O evento já se tornou parte do calendário e é organizado por moradores da favela do Bode que, compondo o Coletivo Pão e Tinta, sentiram a necessidade de fazer a voz da periferia ecoar pelo mundo e criaram o grupo que reúne diversos/as artistas visuais, ativistas, educadores/as sociais e pessoas engajadas em fortalecer o movimento de conscientização e libertação por meio da arte. “É uma vez por ano essa parada, mas a galera trabalha o ano todo!”, afirma o artista visual Carbonel.
O encontro se deu durante todo um fim de semana, com oficinas, mutirões de graffiti e ações sociais para moradores – como cortes de cabelo -, além de apresentações musicais com artistas locais e convidados/as.
Carbonel fala da importância do intercâmbio entre artistas e comunidade, que contribui para que as favelas sejam alcançadas no que tange a uma militância pela transformação social. “O que você vê aqui na quebrada é a militância real, a comunidade está participando, a galera está abrindo a porta. Não adianta só a gente organizar e fazer, é necessária a participação, e nesse momento que vivemos hoje é muito importante se manter aberto”, afirma. O militante cultural disse ainda que existe um diálogo para promover um encontro cultural nordestino de caráter internacional.
O grafiteiro Stylo Santos, acelerador cultural e agitador cultural da comunidade do Bode e um dos coordenadores do coletivo Pão e Tinta, contou sobre a história do território e as lutas em busca de direitos básicos. “O Bode é a primeira comunidade tradicional pesqueira do país. Aqui nasceu a colônia de pescadores e pescadoras Z-1. A luta por moradia no Bode sempre aconteceu: temos o quinto metro quadrado mais caro do país e a especulação imobiliária tenta varrer, nós, pretos e pretas de nosso território. Por isso, o Pão e Tinta, que é um coletivo político, chega esse ano com o tema “Corpos em Alvo”, lutando por direito à cidade”, reitera.
A favela do Bode divide espaço com o terreno do antigo aeroclube, agora abandonado e servindo de espaço alternativo de lazer para crianças e jovens (pois não há espaços de lazer dentro da comunidade). Uma das lutas é transformar este local em um conjunto habitacional social, visando suprir a demanda de aproximadamente 1000 famílias que ainda vivem em palafitas no Pina.
A respeito do terreno do antigo aeroclube e a mobilização por moradias, Stylo Santos observa que o Pão e Tinta é oriundo dessas palafitas. “Eu fui morador de uma delas, lá criamos a aceleradora cultural Palafitt, além da Livroteca Brincante do Pina. Esse terreno do aeroclube tem 23 hectares, e apenas três estão disponíveis para habitação popular – que não é social – onde as pessoas terão ainda que pagar o ‘Minha casa, minha vida’. Têm 600 já aprovadas, mas ainda sem liberação da Caixa. Contudo, isso não abrange nem 50% das famílias em palafitas, nem as demais que moram em aluguel. Pautamos o direito de periferia, o direito de existir”, conclui Stylo.
Ao longo dos três dias de evento, a comunidade ganhou cores e novos ares, trazendo vida e alegria à rotina dos/as moradoras. “Show de bola, gostei! Gostei do trabalho, ficou bonito, tá massa!”, destaca Ambo, morador do Bode.