Reportagem publicada no jornal A Voz da Favela – Recife de janeiro de 2020


Para o professor José Nilton é impossível discutir hoje a realidade social brasileira sem ter a perspectiva étnico-racial e de gênero

Torna-se cada vez mais importante a presença de negras e negros ocupando os espaços de poder na sociedade. Frases como “O Brasil é um país miscigenado” ou “Não existe racismo no Brasil” são comumente propagadas na mídia e, por vezes, reproduzidas pelas/os brasileiras/os. Mas a verdade é que a luta contra o racismo não acabou e está longe de ter fim. A população negra é maioria no país, e, em maior parte, ocupam favelas e periferias afastadas dos grandes centros de negócios e oportunidades das capitais, mas sustentam a máquina através de sua força de trabalho.

Por muito tempo, o corpo negro foi proibido por lei e pelo chicote de frequentar espaços de discussão política. Mas, com muita luta, essas barreiras foram ultrapassadas. As cotas nas universidades são uma prova do processo de luta por igualdade e reparação histórica de todo esse período sombrio, em que espaços como universidades e boas escolas eram permitidos apenas à elite brasileira e seus descendentes.

Segundo o professor José Nilton, pós-doutor em Antropologia Social e professor titular da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), o espaço da universidade tem se potencializado nos últimos 20 anos após a entrada de professores/as negros/as, mas o ensino ainda é colonialista. “Hoje, identificamos uma pulverização de pesquisadores e pesquisadoras negras dentro do sistema. É uma resistência que se ancora em perspectivas curriculares ainda não integradoras, que ainda não absorvem essas demandas de novas populações, não só afrodescendentes, mas também das populações indígenas, saberes de povos tradicionais que devem fazer parte do conhecimento a ser produzido e socializado dentro das universidades”, afirma Nilton.

Ainda falta muito para vermos um cenário igualitário. A busca pela diversidade e representatividade em espaços como universidades, cargos de gerência, televisão e outras profissões elitizadas é uma luta de séculos. “Com a perspectiva do ingresso de estudantes negros e de estudantes indígenas dentro das universidades, depois de quase 18 (dezoito) anos de ações afirmativas no ensino superior público, temos o corpo negro e indígena lançando sua própria leitura de realidade, introduzindo elementos para entender os problemas sociais que vivenciamos”, conclui José Nilton.