Nas décadas de 1960, 70 e 80, no Brasil houve um dos maiores processos migratórios do mundo. Milhões de nordestinos fugiram das péssimas condições de vida, da falta de emprego e da seca em suas regiões. Em sua maioria, eles foram para a Região Sudeste. Não tenho os dados precisos, mas os números são maiores que a população de muitos países.
A esperança de emprego e renda quase esvaziou algumas cidades no Nordeste de sua população economicamente ativa.
O mestre Luiz Gonzaga registrou bem esse fenômeno social, assim como outros artistas e obras também o fizeram, dado o tamanho do processo, narrando situações de saudade e solidão, longe de sua terra natal.
Hoje está se dando, a nível mundial, um processo parecido, em proporções bem maiores. Milhões de chineses deixam sua terra natal, em busca de oportunidades, mundo afora.
Pode-se perceber isso quando se vai comprar um salgado, em qualquer pastelaria nas capitais, ou ao ir a centros comerciais, como o S.A.A.R.A, no Rio de Janeiro ou na rua 25 de março, em São Paulo.
São muitos chineses, além, claro, de outros países, como chilenos, bolivianos, ou equatorianos, com seus chapéus e mantas. Os chineses, diferentemente dos nordestinos das décadas passadas, parecem já ter uma rede social que os protege. Uns rapidamente já são “donos” de boa parte do S.A.A.R.A, passeando de carro importado, mesmo falando poucas palavras em Português.
Como se explica isso?
Uma das explicações chama-se D.I.T.( Divisão Internacional do Trabalho). Uns “nascem” pro trabalho outros “nascem” para o capital … No caso dos chineses nos parece que eles saem de seus países para acumular capital, “enriquecer”; e para isso contam com uma mínima base educacional, enquanto que os nordestinos e andinos saíram de suas cidades para vender sua força de trabalho e mais nada, e chegam semianalfabetos …
Mas, onde eu disse redes sociais, pensei dizer máfia chinesa.
A máfia, assim como quaisquer das grandes organizações criminosas começaram funcionando no conceito de rede. Por exemplo, as máfias italianas, a Yakuza, as gangues irlandesas, as quadrilhas de negros, etc e tal. Sempre em resposta a cenários socioeconômicos de crise. No caso dos chineses, suspeita-se que é a máfia quem disponibiliza capital e autoriza os “empreendimentos”. Claro que com uma taxa bem alta.
No Brasil, o caso dos gaúchos (rio-grandenses, catarinenses e paranaenses) que se espalharam pelas novas fronteiras agrícolas nas regiões norte e nordeste (e até no Paraguai) é um caso interessante. Pois eles carregam o seu modo de vida (através dos C.T.G.’s, Centros de Tradição Gaúcha) e acabam se tornando uma força cultural, social e política, chegando a eleger parlamentares e até prefeitos, assumindo o domínio político local, como sempre relata o geógrafo Rogério Hasbaertt.
Esta vinda de chineses e de outras levas para o Brasil se deu em parte devido ao seu papel no cenário mundial atual, com um excedente de mão-de-obra, na casa da centena de milhões. Penso eu que se compara à emigração européia em direção aos Estados Unidos, no início do século passado, na busca pela “terra das oportunidades”. Os chilenos que ficam fazendo malabarismos nos sinais que o digam.
Mas tal capacidade de ofertar oportunidades de empregos e negócios tem um fôlego finito, fugaz. Como tal, possivelmente também terá o fluxo emigratório para cá. Assim se deu a diminuição da migração regional, tendo diminuído nos meados dos anos 2000, como apontam as estatísticas.
Por um lado, pode ser que com o agravamento da crise européia isso avance no sentido de nos comparar aos EUA do início do século XX. O que acontece é que cumprimos regionalmente um duplo papel de semi-colônia/submetrópole na tal da D.I.T. Mas, por outro lado, esse é um processo limitado, pois não temos total soberania política, nem autonomia tecnológica e muito menos independência financeira, elementos vitais para alçarmos a condição de metrópole.
Nosso progresso é um progresso sustentado de 10, 20, talvez 30 anos no máximo. Mas este é subordinado e dependente. Por exemplo, a diminuição do crescimento chinês de 10% para 4% já colocou em risco os prognósticos otimistas. E com a crise européia não temos muito para onde correr. Ou seja, nosso crescimento tende a acompanhar o ritmo do dragão chinês.
Outro dado interessante desse processo todo é que as entradas de emigrantes nos EUA do século passado e neste, assim como os dados de migração interna do Brasil, em geral, são bastante documentados.
Já esse novo afluxo de chineses e sul americanos não parece ser muito registrado pelas autoridades, posto que se dá ilegalmente. Posso estar errado, mas a maioria deles tem uma cara de assustados. Como se estivessem sempre errados, ou ilegais.
Isto ocorre porque hoje isso se dá num momento conturbado, apesar de todas as áureas sobre globalização e afins. Esses imigrantes, especialmente chineses, são na prática exilados, párias, como os cubanos que praticamente nadam até Miami (os chamados balseros). Eles Funcionam como exército de reserva, pois trabalham por salários menores, jornadas maiores e remetem dinheiro (capital) de volta a seus países por vias “escusas”.
Maximiano Laureano da Silva, com a colaboração de Dirley Santos