Março é mundialmente conhecido como o mês das mulheres tornou-se época símbolo de luta por direitos femininos. No passado, a data era marcada pela luta das socialistas, reivindicando o voto, sistema excludente capitalista e desmandos do patriarcado. Outra história bastante popular é a de trabalhadoras de uma fábrica têxtil, em 1929, nos Estados Unidos, que morrem carbonizadas – vítimas de um incêndio criminoso em março de 1957. Contos históricos à parte, apenas em 1975 o dia 08 de março foi reconhecido pela Organização das Nações Unidas (ONU) – a data que estabelece as conquistas das mulheres. No Brasil, acontecimentos marcantes são relevantes, como o direto ao voto feminino em 1932 e mais participação política das mulheres. No Rio De Janeiro, o ano de 2016 fora marcante para os cariocas. Ano em que Marielle Franco se elegeu vereadora com 1.688 votos. Mulher, negra, lésbica, acadêmica e favelada – características que levaram ganhar confiança da população.
Dois anos depois, 14 de março de 2018, Marielle Franco, Anderson Gomes e Fernanda Chaves, foram vítimas de um atentado em que tirou a vida da vereadora mais votada do Rio e de seu motorista, nos cruzamentos das ruas Joaquim Palhares e João Pedro I, limite entre os bairros Estácio e Cidade Nova. Um ano depois do crime, no dia 10 de março, a justiça do Rio determinou que o policial reformado Ronnie Lessa e o ex-PM Élcio Queiroz sejam julgados por Júri Popular pelas mortes da parlamentar carioca e seu motorista. O crime ainda não foi esclarecido e a Justiça ainda não deu uma resposta à sociedade.
Buscando manter viva a chama de esperança para uma periferia mais igualitária e justa, o grupo Grupo de Mulheres Yepondá produz ações de empoderamento para mulheres de São João De Meriti, na Baixada Fluminense. O projeto começou quando a ativista pelo diretos humanos Ana Lucia Ferreira, a Iya Lucia de Oxum, realizava trabalhos sociais no bairro de Éden, que com o passar do tempo, sentiu incômodo ao perceber que números de feminicídio e violência contra a mulher aumentaram na região. Assim, ela decidiu, juntamente com outras mulheres, fundar o Yeopondá. O grupo tem cunho ativista e faz parte de Conselhos de Igualdade Racial, Política para Mulher e Cultura, um coletivo de iniciativa não governamental. A ideia do coletivo é estar dentro dos órgãos públicos para que as participantes possam ter suas vozes ouvidas e opinarem sobre políticas públicas.
– Nós trabalhamos com a questão da cultura negra. Falamos de ancestralidade, empoderamento a mulheres negras para que possam se reconhecerem no local onde estamos. E nossa história para que possamos sobreviver e resistir. Essa é a nossa luta – descreve a fundadora do Yepondá.
O grupo desenvolve o projeto Carolina Maria De Jesus, uma ação que tem o objetivo de auxiliar no comprimento da Lei 10.639/03, lei que estabelece a obrigatoriedade da história da cultura negra na grade curricular nos ensinos de educação básica, além de deixar vigente o 20 de novembro como Dia da Consciência Negra no calendário escolar. Como base do projeto Carolina Maria De Jesus, o coletivo Yepondá tem um enorme acervo com livros, documentários e livros com conteúdo de cultura e religião voltadas para a questão racial.
– Fazemos rodas de conversa, organizamos eventos, cursos de direitos humanos e tudo aquilo que venha acrescentar para o Yeopondá e que o grupo esteja preparado para acrescentar na sociedade – enumera a ativista.
Grupo de Mulheres Yepondá existe há 13 anos. Parte das integrantes do grupo vem de áreas da militância e outras foram atendidas pelo coletivo. Uma curiosidade é que na sua formação muitas integrantes são de religiões diferentes, senhoras de 80 anos e adolescentes de 14 anos – fatores esses que são favoráveis para ideologias e pensamentos diferentes na construção de um diálogo de paz e um trabalho coletivo em prol da comunidade. Um exemplo real é a arte educadora Bárbara Souza, licenciada em Dança UFRJ, há 8 anos participando do coletivo. A moça conta como ser evangélica não interferiu na sua participação.
– É um grupo em que a diversidade, a tolerância e o amor são os pilares. É um trabalho de resistência. Apesar de inúmeras dificuldades de tempo, espaço e recurso financeiro, não medimos esforços para realizar as atividades – conta.
Agendas específicas são diferencial do Yepondá, elas estão presentes na Marcha Mundial Das Mulheres Negras, atos públicos do 8 de março, entre outros. Esse ano, o tema escolhido para a tradicional confraternização anual do grupo foram dois anos sem Marielle Franco, que aconteceu na praça de Éden, em São João De Meriti – lugar de imensa circulação de mulheres para ser realizado. Mesmo sendo um assunto sério e delicado, Iya Lucia decidiu de forma lúdica e objetiva realizar o evento anual com o título em 2020 “Amanhecer com Marielle Franco”, que reuniu mulheres com várias ações como roda de conversa, exposição de artesãs e muita dança.
– Esse momento para o Yepondá foi de muita importância. Ocupar a praça porque é onde estão passando a população, tem supermercado… as pessoas pararam e levaram nossa mensagem – relata Iya Lucia.
– Como mulher e negra sinto dor e indignação. Perdemos uma grande referência de mulher negra no poder público. Conhecimento é poder e Marielle tinha os dois. Precisamos nos fortalecer, trocarmos experiências umas com as outras. Ocuparmos os diversos áreas da sociedade – disse.
Yepondá na tradição Yorubá é uma divindade da cultura africana que representa a ancestralidade e a maternidade. É Oxum, nos contos de matrizes africana. De acordo com a crença, Oxum se posicionou sobre a criação do mundo na forma da sua organização.
Com essa citação e coragem de tantas mulheres fortes devemos pensar na cobrança de políticas e direitos com mais eficácia para mulheres periféricas e faveladas. A cada momento acontece um crime contra a vida da mulher pelo Brasil e a Baixada Fluminense tem quantitativo extenso nesse sentido. Precisamos entender, apoiar mais espaços de fala para que possamos criar um ambiente seguro e acolhedor para todas.