O setor de atividades artísticas, criativas e de espetáculos foi o mais afetado economicamente devido às práticas de prevenção à Covid-19, de acordo com o Ministério da Economia. Uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2018 mostra que cinco milhões de pessoas trabalham no setor cultural no Brasil e 44% delas são autônomas.
O produtor e gestor cultural Oderval Júnior, de 41 anos, promove sessões de cinema ao ar livre em bairros das periferias da capital mineira e região metropolitana. Com a interrupção das atividades, ele participa de lives nas redes sociais, mas lamenta que nada substitui o contato direto com o público.
O produtor planeja realizar apresentações seguindo o novo formato drive-in. “Em nosso caso, não excluímos ninguém, pelo contrário. Montamos uma estrutura para receber até 50 pessoas sentadas e com o devido distanciamento, além de receber até 50 veículos, proporcionando evento de baixo impacto e inclusivo”, explica.
Fernando Calleb, de 27 anos, é sócio do espaço Black to Black Afro Pub, um local de referência da luta, cultura e beleza negra. Ele conta que fechar as portas do comércio afetou diretamente a sobrevivência familiar. O espaço retomou o funcionamento em forma de delivery, e foi criada uma vaquinha na internet para conseguir quitar as despesas básicas.
O empreendedor diz que também tem produzido lives no intuito de fortalecer o trabalho de poetas e músicos parceiros, além de ilustrar a resistência. “Sobre o resultado, acaba que as lives são mais para não deixar morrer aquele sonho de que tudo vai voltar ao normal”, desabafa.
O cientista social e ator Marcos Mateus faz parte do Coletivo Encruzilhar, um grupo integrado por artistas da área da música, teatro, audiovisual e performance. Atualmente conta com a ajuda de familiares para superar os efeitos econômicos da pandemia e busca por apresentações de teatro on-line.
O ator menciona que ao mesmo tempo que faltam recursos para os shows virtuais, o artista precisa usar toda sua criatividade para tentar inovar e se apresentar da melhor forma possível. Marcos Mateus afirma não estar satisfeito com as opções de diversões atuais. “Da mesma forma que é excludente a questão do acesso à internet, computador e celular para ver as lives, o drive-in seleciona quem pode e quem não pode ter acesso a determinado bem cultural”, lamenta.
O grupo de dança afro-periférica Identidade estava no início da execução do projeto da Lei Municipal de Incentivo à Cultura quando os eventos foram cancelados. Um dos integrantes, Pablo Xavier, de 20 anos, recorre a trabalhos temporários fora da área cultural para sobreviver à crise.
O artista usa as lives como um espaço para debates sobre o universo da arte e não aposta no formato drive-in. “São pensados para um recorte específico de pessoas. Isso não tem afetado diretamente a galera das favelas porque a nossa forma de diversão é coletiva”, afirma.
Ele acredita que o auxílio emergencial da Lei Aldir Blanc não vai beneficiar pequenos artistas territoriais, principalmente pela burocracia e exigência de documentações que a maioria não possui.
Os recursos da Lei de Emergência Cultural Aldir Blanc foram depositados na conta aberta do município de Belo Horizonte na terça-feira, 22. O valor foi de R$ 15,8 milhões. A regulamentação municipal e o cadastramento para solicitação do benefício por responsáveis por espaços culturais e chamamentos públicos ainda não foram publicados pela Prefeitura de Belo Horizonte.
A Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais disponibilizou um formulário para cadastro prévio de pessoa física a fim de fazer um levantamento das informações do cenário cultural de Minas Gerais, o que não garante o recebimento do benefício.
Drive-in
O drive-in é uma modalidade que promove shows ao vivo onde a plateia assiste às apresentações de dentro do carro e se manifesta com buzinas e faróis. No Brasil, o limite é de 300 carros por estádio ou estacionamento. Esse formato veio dos anos 60, quando as telas de cinema eram exibidas ao ar livre, e o público via os filmes nos veículos. Foi retomado para cumprir com as ações de distanciamento social durante a pandemia do coronavírus.
Lei Aldir Blanc
A Lei nº 14.017, de 29 de junho de 2020, denominada Lei Aldir Blanc, recebeu esse nome em homenagem ao compositor e escritor que morreu em maio em decorrência da Covid-19. Ela foi criada com o intuito de promover ações para garantir uma renda emergencial para trabalhadores da cultura, espaços artísticos e culturais, microempresas e pequenas empresas culturais, cooperativas, instituições e organizações culturais comunitárias que tiveram suas atividades interrompidas por força das medidas de distanciamento social para o controle do coronavírus.
A ajuda de R$ 600 será feita pelos estados. Os municípios serão responsáveis por distribuir os recursos para os espaços.
Esta matéria foi produzida com apoio do Fundo de Auxílio Emergencial ao Jornalismo do Google News Initiative