Não raras vezes, nos perguntamos até onde vai a impunidade. Somos espectadores diários da violência urbana e do desrespeito à vida, entretanto nos limitamos, muitas vezes a assistir a impunidade passivamente, como resultado único e como único fim dos casos de violência com os quais nos deparamos.
Diante disso, não poderíamos deixar de ressaltar uma das maiores vergonhas e decepções já ocorridas em nosso Estado, quiçá em nosso país: A Chacina de Vigário Geral.
Ocorrida em 29 de agosto de 1993, a chacina teve o envolvimento de policiais civis e militares, totalizando trinta e três acusados, dos quais somente dois foram condenados.
O sentimento de revolta e indignação causou também uma grande decepção na sociedade, bem como espanto em todo o mundo pela forma descarada como o caso foi tratado.
A problemática que envolve a Chacina de Vigário Geral que faz quinze anos no dia 29 de agosto de 2008, chama a atenção de todos nós para problemas como desigualdade social e desvalorização da vida humana, sobretudo com os moradores de comunidades carentes que sofrem com o desamparo do Estado e com o preconceito de elementos da sociedade.
Infelizmente está inserido em nossa cultura o preconceito com os moradores de favelas, e muitos fazem questão de dar continuidade a esse tipo de comportamento esquecendo-se que esses moradores representam a verdadeira fisionomia do povo brasileiro. Essa cultura se criou e se refaz a cada dia colocando a favela como um lugar à parte de nosso espaço geográfico, ou seja, como um lugar estranho onde ocorrem coisas estranhas e que não acontecem em nossa cidade, com problemas que não têm prioridade na pauta dos assuntos atuais. Poderíamos dizer, sem correr o risco de ser simplistas, que essa cultura, talvez, inconsciente, mas com toda a certeza, preconceituosa, é na realidade, a extensão dos preconceitos raciais, se é que se pode chamar assim, pois o conceito de raça não se refere a cor da pele, existe, pois, a raça humana, isto sim. Vista sob esse prisma, notamos que a favela é a grande senzala, que hoje não se limita mais aos só de pele negra, mas também aos de pele clara, e que se transferiu para o plano espacial a temática “racial”.
O que, porém, choca profundamente é perceber essa posição arredia da sociedade, de forma geral, aos moradores das favelas e aos problemas pertinentes a essas comunidades. Problemas inerentes da exclusão social que propicia a falta de oportunidades e a baixa competição no mercado e que, por essa razão, deveriam ser analisados com mais atenção e boa vontade.
Entretanto, cada vez mais se observa a crescente atuação social de jovens oriundos de comunidades carentes que mostram à sociedade seu valor e sua dignidade, desmistificando o imaginário que marginaliza as pessoas de comunidades carentes. Isso reforça a idéia de que a carência é capaz de realçar diferenças, preconceitos e atitudes hostis, tornando frágeis os carentes e mostrando que as relações humanas são mensuradas pelo poder econômico de cada um e não por sua integridade e seu caráter, como deveria ser.
A Chacina de Vigário Geral assim como tantos outros casos de violência nos revela a insustentável situação de impunidade vivida por nós e recalca em nossa consciência mostrando-nos a importância da participação de todos em lutar por seus direitos e a importância de se ter responsabilidade social e iniciativa para mudar tudo aquilo que não nos traz benefícios. .
Tendo consciência de que a violência é o produto final de um Estado doente e de problemas sociais antigos, concluímos que precisamos exercer nossa cidadania e propor, enquanto cidadãos e atores sociais, soluções que possam, de fato, sanar suas conseqüências.
Diante disso, o que nos resta é procurar através dos movimentos sociais nos mobilizarmos para que o caso de Vigário Geral não seja mais um caso apenas, isto é, mais um a ir para os arquivos, condenado a ser esquecido por todos. É através da lembrança das arbitrariedades e abuso de poder, como também a lembrança dos inocentes mortos que não deixará se apagar da mente de toda a população da necessidade de que algo deve ser feito e que somente nós poderemos transformar nosso país em um lugar mais justo e bom para se viver. Aguardemos, pois!
Claudia Andrade – Estudante de Filosofia da UERJ