O grafite de João

foto: Marcella Saraceni

João sempre foi artista. 

Daqueles que desenhavam um futuro otimista. 

Todos os seus traços eram muito mais que bonecos de palito. 

Sua inspiração vinha de um mundo infinito. 

 

Sonhar e acreditar nunca saíam do seu dicionário.

Mas a vida o colocaria em outro cenário.

Talvez a felicidade tivesse outro destinatário. 

Não seria um caso muito raro.

 

Aos 11, enfrentou o abandono do pai. 

Aquele senhor, usuário de drogas, não voltou mais.

Aos 13, perdeu a mãe em uma enchente. 

Desde aquele dia, 10 pessoas não vivem mais entre a gente.

 

Aos 14, era responsável por um filho. 

A Terra ganhava mais um menino e um homem precoce. 

Em dias de frio, ele não sabia nada sobre tosse. 

 

Aos 17, largou os estudos. 

Aos 19, já estava em seu 10º bico. 

Entre um rascunho e outro, nas horas vagas, tentava voltar ao início.

 

Porém, o tempo não pediu licença para passar. 

Arte no país demora a sustentar.

Murais urbanos sempre custam a pôr comida na mesa. 

Nada, aos 26, cobria as despesas. 

 

Aos 29, terminou a escola e começou um curso.

Mas, aos 31, se tinha conseguido meia dúzia de trabalhos bem pagos, foi muito. 

Como pai de família, era cobrado por seus descuidos. 

 

Anos e anos se passaram até aquele telefonema.

O final dos seus problemas.

Hoje, aos 35, narra sua trajetória até chegar a este convite. 

Os versos falam da vitória de João, em seu primeiro enorme grafite.