A conta da aventura será alta para os militares que tudo sabem, tudo podem

A tropa nem sabe o que defende - Foto newyorktimes.com

Os militares pagarão a conta, cedo ou tarde, da adesão ao presidente Jair Bolsonaro, primeiro porque uma coisa é tomar o poder à força contra o comunismo internacional que pretensamente estendia suas garras ao solo pátrio. Não era nada disso, mas não importa, valeu o apelo ideológico e a massa apoiou o golpe militar de 64 com a elite, a igreja católica e demais conservadores.

Agora, como já se escreveu nas redes, os milicos voltam ao poder não como usurpadores, mas sim como convidados, pela porta da frente e com serviçais para pendurar os quepes do cabide do poder. Estão em toda parte, a saída de Nelson Teich na última sexta-feira ensejou o comando do Ministério da saúde por mais um general. O país é um grande quartel onde o capitão enlouquecido manda como Simão Bacamarte ou um napoleão de hospício.

Em 64 havia no Exército nacionalistas, patriotas e até comunistas que defendiam pontos de vista políticos e filosóficos em pé de igualdade com os confrades. Era uma luta desigual, mas leal e sincera. Venceram os reacionários violentos e, como é sabido, contra a força não há argumentos. Venceram e impuseram o modelo neocolonialista, a obediência cega ao “grande irmão do norte”, os Estados Unidos da América.

Mas nem mesmo durante o período em que estiveram no poder houve unanimidade e foi assim que Ernesto Geisel não aceitou a imposição norte-americana contra o acordo nuclear entre Brasil e Alemanha e denunciou acordos antigos com os Estados Unidos e ainda expulsou a Chrysler do país, sem maiores explicações. Neste balaio estava também o acordo de cooperação militar dos anos 1950, pelo qual o Brasil comprava a sucata bélica dos EUA pelo preço que eles determinavam.

Foi o último grito nacionalista brasileiro, o chamado canto do cisne, a seguir foi pura entregação, com Figueiredo, Sarney, Collor, Itamar, Fernando Henrique e os governos petistas que se comprouveram à saciedade, à lambança no mel ilusório. Não promoveram nenhuma transformação no país, aumentaram os lucros do capital financeiro, jogaram migalhas pela janela e esperaram em troco reconhecimento e gratidão.

Hoje todos pagamos o altíssimo preço da inércia, da omissão e até da cumplicidade criminosa com o que de pior está na direção desse Titanic chamado Brasil. Sem mais lastro intelectual do que a doutrina norte-americana da Escola das Américas, nossos militares creem de verdade que ser satélite dos Estados Unidos, mais do que destino, é a nossa vocação. Agem imbuídos dos piores sentimentos julgando-se nacionalistas. Por oposição, qualquer pensamento antiamericano ou genuinamente nacionalista é tachado de comunista.

O problema hoje é que não adianta tachar este e aquele de “esquerdopata” ou o antigo e gasto “comunista”. Também os militares estão atônitos com Jair Bolsonaro, a quem carregariam nas costas sem cansaço se não houvesse a pandemia do coronavírus. O presidente que apoiaram e sustentam com galhardia está a comprometer todo o contexto, a saber a credibilidade do país no mercado e na ciranda financeira que a sustenta, a própria essencialidade de exército num país que não faz guerra desde 1865.