Em Brasília, o muro de uma escola pública pintado com o rosto de Nelson Mandela e a frase “A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo” foi apagado com tinta branca por ordem da PM. São tempos de sincera ignorância estes, mas mesmo assim o que terá motivado este absurdo? A resposta é simples: a escola é mais uma que passou a administração da Polícia Militar. Assim caminhamos, para chegar ao ponto de entregar a educação das crianças à polícia…e pior: à Polícia Militar, uma excrescência que surgiu na ditadura de 1964 como braço repressor das forças armadas. Segurança pública é atribuição civil, em qualquer país civilizado. Mas não falamos de Brasil, é claro, onde educadores têm índole totalitária e aplaudem este novo papel da PM.
O muro da escola pública na capital do país é exemplar pelo que sinaliza a todos nós: a educação é encarada como arma capaz de mudar o mundo, ou seja a realidade de desigualdade e injustiça. Assim, a PM adverte que nada será mudado no sentido que o líder africano pregava, as mudanças serão todas formais, estéticas, assépticas, como cabelo cortado, saia abaixo dos joelhos, tênis de cores neutras, nada de brincos, tatuagens, toucas e outros adereços. Ordem unida, disciplina, obediência, asseio e boas maneiras: assim será a futura geração brasileira, azul e rosa com a graça de Deus, ela e as demais pelos séculos dos séculos amém!
Cá pra nós, o que esperar de um país que entrega à polícia a educação formal de suas crianças? Não muito. Aliás, o ministro da Educação disse agorinha mesmo que somos todos ladrões, ou seja, bandidos, mal educados e por aí vai. Não pensemos, no entanto, que isto é de agora; não é não, o magistério de primeiro e segundo graus sempre foi conservador, de botar criança para marchar em parada militar e ensinar que os índios eram preguiçosos e por isto os portugueses tiveram que trazer os negros africanos para o trabalho duro. O que nos ensinaram sempre nas salas de aula foram versões edulcoradas e sumárias da guerra do Paraguai, da independência, da proclamação da república, da abolição da escravatura, de tudo. Canudos, Palmares, Sabinada, as revoltas em geral foram varridas para debaixo do tapete pelos educadores, civis como os juízes do piso ao topo.
Este é o preço que o país paga pela opção escapista e covarde diante da história, ou alguém tem dúvida de que a polícia está nas escolas públicas e os militares no poder porque não encaramos a ditadura militar como fizeram nossos vizinhos sul-americanos, sem medo, de maneira civil e civilizada? Por este erro essencial e histórico, foi eleito um capitão inculto e sem educação para presidir o país numa quadra tão importante como a que o mundo vive, momento de definições estratégicas em todos os campos e setores do conhecimento humano. Por aquela razão primária a que me referi há pouco, retrocedemos a perseguir comunistas e a abominar a diversidade. E não pensem que está perto do fim. Como dizia Millôr Fernandes, “o Brasil tem um grande passado pela frente”, e nós somos os únicos responsáveis por isso.