Por MC Leonardo*
Quem se lembra de como era o Rio há 20 anos sabe o quanto as favelas eram muito mais visitadas. Muitas pessoas (como eu) passaram a conhecer a cidade através dos bailes que existiam nessas localidades. Os bailes reuniam gente de todas as classes, todo final de semana, criando um pequeno passo na ruptura no preconceito existente por décadas. Os bailes do asfalto também fizeram os favelados descerem e conhecerem os espaços de cultura da cidade e, consequentemente, seus bairros.
Com o fim dos bailes, essa aproximação de classes acabou causando um prejuízo social que é incalculável. Falo isso com conhecimento de causa, porque foi um baile de favela (Chapéu Mangueira) que me fez conhecer Alessandra Martins, a mulher com quem estou casado há 21 anos – eu, morador da Rocinha, e ela, moradora da Taquara.
Em minha opinião, o chamado playboy ter deixado de entrar nas favelas não foi o maior prejuízo. O maior prejuízo foi o favelado passar a não frequentar outras favelas. Hoje, o morador só conhece os locais onde mora ou onde tem parentes e amigos. A cada produção cultural que se perde dentro das favelas se perde também a oportunidade de alguém conhecer aquele território que, na maioria das vezes, é retratado apenas em manchetes negativas em jornais que fazem o trabalho inverso da cultura.
Aos meus 20 anos de idade, eu já tinha frequentado mais de 50 favelas e tudo isso por causa do funk. Para alguns pode parecer bobagem, mas conhecer a cidade do Rio de Janeiro de verdade dá uma sensação de liberdade que só quem conhece sabe. Hoje, com 40 anos, tenho orgulho de ter conhecido todo o estado do Rio e de ter visitados todos os estados do Brasil através do funk.
Fico muito triste quando paro pra conversar com a molecada de hoje e vejo que eles não estão visitando as favelas como eu tive a chance de conhecer. Isso vai atrapalhar e muito a visão dos próprios favelados sobre as favelas. Mas a gente vai dando as notícias das favelas por aqui.
* Artigo publicado na edição de julho de 2016 do Jornal A Voz da Favela