O debate sobre as políticas públicas toma forma acentuada no atual contexto, do qual as articulações políticas se organizam em correlações, tendo na agenda as eleições municipais em toda federação brasileira. Os conteúdos mais problematizados no âmbito das divergências políticas entre democratas e reacionários (aqui o termo reacionário não é mero “chavão”, tendo vista a naturalidade com que tem havido o negacionismo dos axiomas científicos e políticos nos últimos tempos) perpassam objetivos e narrativas principalmente nas questões de costumes e de orçamento, ou de forma mais geral, nas questões de cultura e economia, do qual o caráter moral da administração pública está a todo momento no foco.
O fator moral entra em voga com contundência não meramente pelos princípios constitucionais éticos balizadores da administração pública (o da moralidade, por exemplo). Mas pelo fato das pautas dos costumes assumirem para si as ideias éticas e práticas de sociabilidade, onde o campo reacionário atua para explorar suas bandeiras ultraconservadoras, polarizando com a militância e com as ideias progressistas e avançadas, perpassando inclusive pela discussão sobre o Estado.
Isto, tendo por base a evidência da utilização da Inteligência Artificial (IA) para sofisticação das fake news, sendo disseminadas em escala massiva dirigidas à deslegitimação do campo político. Espectro onde não faltará interesses e respectivas narrativas das “frentes legislativas” céticas a um projeto de sociedade democrática e correlato jogo político nos termos constitucionais. Já se podendo reativar a metáfora, por fato constatado, das “marés e suas ondas” na política, pois o recado pelo campo reacionário nas esferas parlamentares, ruas e redes é de que não só estão com sobrevida, mas de que estão com “volume bélico”.
Por consequência, e sabemos, a peleja da conjuntura política no Brasil não está somente no âmbito de aprofundar ou não a democracia, ou mesmo na trajetória de atualização ou modernização, mas no âmbito da sobrevivência ou não da democracia. Assim, outro paralelo que pode ser analisado, portanto, é de como o reacionarismo pode utilizar da legislação para sufocar ou deslegitimar os processos democráticos, e por sua vez, o debate público.
Toda esta penúria, que tem como mote e resultado a relativização das instituições democráticas, no stricto sensu, ou seja, no que de fato são e representam (ainda que com suas fragilidades críticas dentro do próprio campo democrático). Se nota a necessidade de refletir sobre a estrutura política institucional baseada no presidencialismo. O presidencialismo que carrega consigo o acúmulo de poderes, governamental e estatal, por si só demonstra fragilidades tendo em vista o condicionante de convencimento do parlamento nos processos decisórios, e por outro lado, sendo essa uma condição para a própria legitimação frente aos órgãos estatais.
O que é uma complexidade, inclusive problematizada por mais de uma corrente política, dos progressistas aos conservadores, onde a grande questão é de qual seria a alternativa. Tendo em vista que o parlamentarismo seria uma situação de maior descentralização do poder, e que hipoteticamente distensionaria os processos decisórios, impactando automaticamente na administração pública. Porém, estando, ainda mais longe de solucionar a ameaça de retrocesso pelo campo reacionário que reivindica abertamente, se não a ditadura, o absolutismo (loucura!).
Deste, ponto de vista, é importante compreender as consequências das situações extremadas do campo político na realidade material e psicossocial da sociedade civil, em especial da população mais vulnerabilizada. Que em alguns casos passam a desacreditar da própria democracia, e até mesmo questionar se a democracia existe. Sendo outro ponto explorado pelo campo reacionário. Pois, se não há sensação de democracia, logo não existe por parte deles (os reacionários) ataques à democracia.
Eventos desse tipo se traduzem em espólios políticos que como visto no processo de impeachment (golpe), da presidenta Dilma Rousseff, foram explorados pelos setores ultraconservadores do parlamento, a partir da narrativa antipolítica e da judicialização da governança. Temática estreitamente relacionada com o conceito da pós-verdade enquanto insumo da desinformação, a partir de setores dos meios de comunicação tradicionais e não tradicionais. Sendo atualmente mais intenso a partir da “informalidade” de páginas e canais da internet, e redes sociais, deliberadamente fake.
Na prática, todos estes elementos do contexto político, que como sinalizado também se formatam em fenômeno social, precisam ser vistos no conjunto das eleições municipais. Tendo em vista que a característica do poder público municipal é de descentralização (ou autonomia) em relação à federação, e portanto, menos centralizada que a eleição presidencial. Com menor controle, ao tempo que não são menos mobilizadoras. E que o lastro central das disputas tem foco no orçamento e na administração pública, que é algo muito mais concreto que a abstração dos debates das narrativas fake. Além disso, para tal objetivo, se forma uma espécie de “mobilização descentralizada”.
Cabe registrar, que tal situação não é somente (ou meramente) via de composição política estrutural das eleições municipais no âmbito das candidaturas. Mas, diretamente relacionada à política econômica do país, delegada em forma federativa, que tem nas políticas públicas o elo entre o tipo e a qualidade dos serviços públicos prestados aos/às cidadão/dãs. A ver, Emendas Parlamentares e processos licitatórios. E, assim, estando a se falar das prefeituras que sofrem ou participam de pressões políticas (e não políticas) de forma agudizada, muitas vezes impedindo as variáveis inerentes às políticas públicas, entre elas a transparência.