Em uma manhã de 2016, moradores do Mutuá, bairro da cidade de São Gonçalo, acordaram perplexos. Uma de suas ruas residenciais e de pouca movimentação amanheceu com pichações de símbolos nazistas nas casas vizinhas àquela onde residia um integrante de grupo skinhead, detido em 2013. Primeiro, o choque na descoberta do envolvimento de um indivíduo tão próximo nessas organizações. Segundo, o espanto por toda a intolerância declarada a que a suástica faz referência. Em seguida, a incompreensão de como em um país como o Brasil, e num estado caracterizado pela diversidade, haveria grupos que propusessem o ódio tão abertamente.
Estamos agora em 2018, e essas reações são identificadas, dessa vez, por grande parte dos brasileiros. A barbárie demonstrou sua forma nesse último mês: a divulgação do ícone de conotação nazista ganhou novas proporções e plataformas de exibição. Em Nova Friburgo, a capela de São Pedro foi pichada com suásticas na madrugada do dia 14 de outubro. Esse episódio, ocorrido em uma localidade onde o isolamento e a tranquilidade apresentavam-se como principais características, demonstrou a todo país o quão difusos estão os discursos antidemocráticos e discriminatórios, e o quanto é necessário estar atento para combatê-los. No dia 17, outras manifestações de ódio foram registradas, dessa vez em duas universidades públicas do país: na UFJF e USP, o mesmo símbolo foi reproduzido nos banheiros da Reitoria e no Conjunto Residencial, respectivamente.
O crescimento da ameaça intolerante está diretamente relacionado à veiculação de discursos de ódio e de posições contrárias aos direitos humanos por parte de candidatos políticos nessas eleições. Em Porto Alegre, uma mulher foi agredida e marcada com uma suástica por um canivete. Segundo a vítima, os agressores a atacaram devido ao uso de uma camiseta com a frase “Ele Não”. Entretanto, o delegado responsável relativizou o ícone desenhado, defendendo que poderia se tratar de um símbolo budista.
De fato, a suástica não é um símbolo apenas nazista. Civilizações antigas já a utilizavam em ornamentações e, antes da Segunda Guerra, apresentava em diversas regiões europeias uma conotação de sorte. Entretanto, quando, em 1930, o partido nazista apropriou-se da imagem utilizando-a como dogma político, o símbolo foi eternamente ressignificado.
Dessa maneira, não há como relativizar. Não se trata de polissemia. Não se trata de expressão da cultura budista. E não se trata de um desenho qualquer. Trata-se da expressão da discriminação. Trata-se da ameaça aos direitos humanos e à democracia. Trata-se de um assunto que precisa ser tratado, discutido, e não relativizado. Como desenvolvido por Hannah Arendt, trata-se de não banalizar o mal, a fim de evitar que ele se torne algo habitual.