Estava lá, ontem, na lista dos 12 secretários do novo prefeito Marcelo Crivella: Nilcemar Nogueira, neta de Dona Zica e Cartola e diretora do Museu do Samba, acaba de ser anunciada como secretária municipal de cultura. O anúncio surpreendeu e, de certa maneira, aliviou a todos que acompanham a vida cultural e política do Rio nos últimos tempos. Em uma lista de nomes duvidosos da nova gestão municipal, a presença de Nilcemar soa como um sopro de esperança.
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Doutora em Psicologia Social pela UFRJ e mestra em Bens Culturais e Projetos Sociais pela Fundação Getulio Vargas, Nilcemar Nogueira é uma grande militante do samba. Viveu intensamente os últimos anos de vida do avô adotivo Cartola, com quem dividia a casa ao lado da família e a quem acompanhou em compromissos profissionais até sua morte, em 1980. A preservação da memória do gênero que fez a história de sua família a encorajou a fundar, ao lado do irmão, o Centro Cultural Cartola em 2001, após passagem pela direção do Museu da Imagem e do Som.
Primeiramente, a indicação de Nilcemar para o cargo é um alento para os amantes da cultura carioca. A proximidade dela com o universo do samba resolve um dos principais temores dos não eleitores de Marcelo Crivella, que é bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus – famosa pelo radicalismo neopentecostal. A eleição de Crivella gerou muitas dúvidas sobre os investimentos municipais no samba e no Carnaval, supostamente, em prol de eventos gospel. Ainda que a nova secretária seja uma grande crítica do modelo mercantilizado do Carnaval das Escolas de Samba do Rio, esperamos que qualquer suspeita de cortes possa ser dissipada em definitivo a partir de agora.
Além disso, mais importante do que uma mera indicação política, ter uma mulher negra e de origem periférica na Secretaria Municipal de Cultura é de grande representatividade para quem vive à margem. É ainda extremamente simbólico que, nestes tempos obscuros que vivemos, a periferia possa ganhar este tipo de protagonismo em um governo que, dados os fatos, ainda na campanha se anunciava tão conservador. Nilcemar viveu muitos anos entre Olaria e o Morro da Mangueira, onde viviam seus avós, e certamente entende que a cultura da periferia, ainda que funcione de maneira orgânica, pode se desenvolver sempre e mais quando o Estado lhe enxerga como tal. Olhar para as profundezas destas relações poderia ser o primeiro passo para uma grande gestão.
A nova secretária de cultura também deve manter abertos os olhos da SMC para o que é produzido na cidade como um todo. Com todas as críticas existentes à gestão Paes, programas como Ações Locais foram fundamentais para que a cultura da periferia pudesse minimamente se estabelecer como lugar de fala e expressão para quem está fora do eixo Centro-Zona Sul. A cultura periférica é samba, mas é também funk, hip hop, rap, forró, rock. Não adianta cobrir um santo e descobrir o outro.
Esperamos que, em um ano, seja possível elencar críticas positivas à nova gestão da Secretaria Municipal de Cultura. O fundamental é seguir acreditando que poderemos continuar a ver a cidade efervescendo de arte e cultura. Ainda que os prognósticos não sejam exatamente bons para a política e a economia em 2017, “finda a tempestade, o sol nascerá” – já dizia um certo mestre.