Acordei suado e com taquicardia. Minhas pálpebras tremulavam. Que sonho, meu Deus! Que país é este que tanto afeta nossa psique! Tenho que compartilhar com todos.
Após o protesto, na Cinelândia, Paula Lavigne, ainda de megafone em punho, liga pro seu motorista; que chega em seguida, com Caetano já pronto no banco de trás.
– Corre, leoa… Huck já ligou três vezes… A cerimônia já vai começar…
Ela entra no carro, veste o longo, puxa o espelho, se maquia, ajeita o cabelo, passa roll-on no sovaco e perfume no pescoço. Uma bomba explode ao longe. Caetano percebe que ela não larga o megafone. Delicadamente, tenta tirá-lo de sua mão para deixá-la mais à vontade. Paula resiste, sua mão se fecha, o olhar duro, fixo, o megafone parece uma extensão do seu corpo.
O carro sobe Santa. Motorista preocupado, avança Silvestre, Paineiras, até chegar ao Corcovado. Caetano cantarola um axé recente que o comoveu. Muitos carros, todos pretos, nunca se viu tanta celebridade naquele canto da Floresta da Tijuca.
Era o casamento do ano. Guy, produtor-pica da Madonna e do U2, e Michelle, a belle megamodelo brazuca, aos pés do Redentor, aquela vista maravilhosa, os tiroteios como exóticos pássaros distantes, ocultos na noite, submersos pela estonteante “morrosidade” beira-mar.
Angélica sorriu quando os viu, se aproximou. Luciano pegou o Zap de Demi Moore e foi em direção ao casal. Abraçaram-se efusivamente. O repórter do “Pânico” chegou e geral cagou pra ele. Entraram. Cerimônia linda. Deus presente, com cachê, segundo as más línguas.
Após a troca de alianças, o bonde desceu as paineiras. O incrível Huck abriu as portas da mansão e a elite local, ampliada e global comeu, bebeu, dançou esfuziantemente!
Caetano tomou um último gole de uma Minalba em garrafa de Perrier e, quando foi dar a mão à Paula para descer uma escada, notou que ela ainda segurava o megafone. Encarou-a e percebeu um olhar aguerrido, sanguinolento quase, uma fúria que ele só havia visto – similar, mas diminuída – em reuniões de produção. Paula apertou um botãozinho no aparelho, aproximou a boca, testou o som.
– Luciano, Angélica, Guy, Michele, companheiros e companheiras! O que está acontecendo neste país é inaceitável!
Caetano olhou, pasmo, mas sorriu, com aquele olhar doce de quem já viu de um tudo.
A festa parou. Todos atentos. Os noivos plenos de inovação. Lavigne falou tudo que precisava ser dito. Falou de Temer, de trabalho escravo, de MBL, de onda conservadora, de Globo Golpi– Calma, nem tanto. Madonna, sempre engajada, subiu as escadarias, parou ao lado de Paula e solicitou:
– Please, alguém me inscreve?
Demi Moore fez o mesmo.
– Alguém tá fazendo a mesa?
De repente, já havia uma fila e a plenária foi instaurada. O próprio Guy mandou servir uma rodada dupla de champanhe e levantou o paninho “Vem pra luta amada”, mas de cabeça pra baixo. Todos aplaudiram.
Otaviano Costa tentou uma piada:
– Agora, ‘Fora Temer’ é com Paula dentro!
Todos reagiram!
– Machista! Machista!
Flavia Alessandra acalmou os ânimos narrando a vida a dois.
Eis que Bono Vox se aproxima, pega o megafone… Pega não! Paula segura, e ele fala…
– Está na hora dos encaminhamentos, disse ele, em inglês mesmo. E todos entenderam e/ou fingiram.
Bono seguiu:
– Parece que vocês brasileiros querem derrubar este governo, mas não sabem como. Vamos derrubar esse governo corrupto! I can! You too! Vamos às propostas! 3 minutes pra each um!
Após 125 minutos, a decisão coletiva estava pactuada.
Foi um tal de se armar com o que tinha, catar candelabros, arrancar corrimão de escada, arames de arranjos florais e tudo mais que estivesse ao alcance. Ninguém nunca viu as celebridades deste jeito. Em pouco tempo, já eram 230 VIPs prontos pra luta.
Dos 230, 45 fizeram questão de ir de helicóptero. O restante pediu Uber Black.
Todos seguiriam o plano conjunto de Lavigne-Madonna-Marcelo Serrado, deliberado há ainda pouco na escadaria da ALERJica, ou melhor, da Angélica. Luciano, agoniado, mandava inúmeros Zaps para Aécio, Ronaldinho e Marinhos. Gilmar Mendes mandou um áudio gaguejante.
Parecia que, no miolo da celebrecracia, estava sendo urdida uma nova revolução.
O plano era simples. Pegar o equipamento de som da festa de casamento e montar no meio da Avenida Presidente Vargas. U2 e Madonna comandariam a ocupação, abrindo os shows! Red Hot mandaria duas à capella. E outros. Ao meio dia, já estava tudo pronto. E a multidão começou a se dirigir para o Centro da Cidade.
No Planalto, Rodrigo, esbaforido, corria pro Jaburu, levando chá de louro pra bexiga de Michel.
Enquanto isso, em frente à Candelária, deu muito trabalho construir um camarote, mas foi uma reivindicação votada e aprovada pela maioria célebre. Duas da tarde, já havia 230 mil pessoas no entorno da Candelária. NYT, Al Jazeera e toda a mídia mundial transmitiam ao vivo. O engarrafamento ia até o portão do Dória.
Em Brasília, os ânimos se exaltaram. Corre-corre, gritaria, pancadaria, liberação de emendas!
A ocupação repercutia, viralizava, trending topics e tudo! O gigante, mais uma vez, acordava!
Às 6 da tarde, o país, atônito, assistiu ao pronunciamento de um Michel Temer estafado, rendido, cansado. Ele renunciava. E mais do que renunciar, denunciava os colegas, se dizia aturdido, torturado… Entregou Jucá, Gilmar, Geddel, a cúpula toda. E ainda convocou novas eleições.
Moro prendeu Lula por causa de um boleto de locadora de 1985, e o PT, sem alternativa, resolveu que só um nome geraria um consenso necessário naquela hora tão difícil. A eleição ocorreu normalmente em dezembro de 2017.
Paula Lavigne foi eleita com 54.171.342 votos!
O Brasil respira aliviado.