Mesmo conhecendo e transitando na região há 24 anos, eu ainda me impressiono. A Central do Brasil, que ainda no século XIX era chamada de Estação Ferroviária Dom Pedro II e que anos depois serviu de cenário para um famoso filme brasileiro, hoje é puro caos. Parece ironia, mas quanto mais o poder público coloca suas mãos sobre o lugar, mais a situação piora. A começar pelos ambulantes, que impõe sua presença e força os transeuntes a andar pelo meio da rua – a quantidade expressiva de pessoas não cabe mais na calçada. O problema não é o comércio informal, mas não existir outro espaço capaz de abrigar a atividade comercial de quem disso vive.
Desde muito pequena, lembro de ir e vir com a minha mãe para comprar aqueles produtos baratos que só se encontra nos camelôs. Em 2010, durante a gestão do ex-prefeito Eduardo Paes, um incêndio que foi para lá de estranho desabrigou os ambulantes do local. Logo após o incêndio, a área se tornou um mero corredor de ônibus. Dois prédios foram construídos pela prefeitura para alocar os prejudicados, mas isso também não deu certo porque, segundo os próprios vendedores, não há grande circulação de pessoas. A alternativa? Voltar a vender no espaço que abrigava o antigo camelódromo, numa tentativa de dizer: “Olhem, nós resistimos”.
Além disso, o VLT que deveria passar em frente ao o Teleférico da Providência – outra obra faraônica da Prefeitura e que continua com o serviço suspenso – parece pronto, mas ainda não está em atividade. Árvores foram arrancadas na área, que já é quente por si só. Os passageiros, que antes tinham a sombra das árvores para esperar o ônibus, agora aguentam o calor que só aumenta com tanto asfalto em volta. Entulhos das obras do VLT foram deixados para trás e se somam ao lixo que se acumula pelas ruas do entorno.
Particularmente, fico alarmada com o tamanho abandono da região da Central, um lugar de muitas idas e vindas, estadia dos trabalhadores e tão próximo ao Morro da Providência. Vemos obras realizadas sem o mínimo cuidado em um lugar que à noite se torna perigoso e onde ainda falta iluminação. Isso sem falar nos casos de estupro à luz do dia, que correm à boca pequena.
Basta atravessar o túnel rumo à Zona Sul para que se perceba que a realidade é outra: pavimento, iluminação, aparente segurança, conforto… Enquanto isso, a Central, coração da cidade do Rio de Janeiro, recebe sempre o descaso como resposta. A situação em que a região se encontra pode servir como uma metáfora sobre como o poder público enxerga o cidadão que carrega esse país nas costas. Diante de tudo isso, fica o questionamento: a cidade deveria ser e é maravilhosa pra quem?