No último fim de semana, durante os Jogos Jurídicos Estaduais desse ano, alunos negros e alunas negras da UERJ, UFF e UCP foram vítimas de ofensas em três partidas por integrantes de torcida da PUC-RJ. O episódio de racismo começou no dia 02/06, no decorrer de uma partida de futebol masculino, quando um estudante da PUC – Rio (Pontifica Universidade Católica) jogou uma casca de banana para provocar um estudante da UCP (Universidade Católica de Petrópolis). A PUC foi punida com a perda do título de campeã e não poderá participar dos jogos de 2019.
Devido ao episódio da véspera, no dia 03/06, jogadores negros da UERJ (Primeira Universidade do país a adotar o sistema de cotas), UFF E UCP entrariam na partida do jogo de Basquete entre UERJ e PUC de mãos dadas, mas foram impedidos de realizar o ato pela organização. No entanto, começaram a entoar gritos de “racistas, racistas” e na saída os alunos da Pontifica reagiram saindo imitando macacos. Débora Ribeiro, 22 anos, que joga basquete e handebol contou ao Estadão que está na Universidade desde 2015 e convive com o racismo estrutural. “Nunca havia presenciado um episódio de racismo tão gritantes como esses”.
Débora ainda afirmou que ouviu uma das alunas da PUC dizer “você acha mesmo que com o meu rostinho eu vou ser presa?”. Houve outro caso durante uma partida de handebol entre UFF e PUC em que uma torcedora da PUC chamou uma estudante da UFF de ‘macaca’, resultando numa paralisação de alguns minutos na partida por conta do episódio de racismo. A partida terminou com a vitória da UFF.
Para Ana Carolina Gomes, 23 anos, estudante de direito da UERJ, integrante do coletivo Jogos sem Racismo, é preciso criar consciência de que o racismo é estrutural, que todos tem direito a educação para ter uma vida digna.
Os episódios repercutiram nas redes sociais. No Facebook, a Frente Estadual de Juristas Negros e Negras (Fejunn/Rio) repudiou os casos e cobrou um posicionamento das autoridades da PUC:
“Episódios de racismo desta natureza através do esporte são praticados há décadas no Brasil e no mundo com grande repercussão midiática. É necessário trazer à tona que o Direito e a Justiça são ferramentas fundamentais para a erradicação desta prática. Deste modo, é inconcebível que a PUC Rio, enquanto instituição educacional, tenha em seus quadros alunos, sobretudo alunos de Direito, praticantes de crime de racismo.
A FEJUNN- RJ espera que a PUC – Rio, uma das principais Academias de Direito do Brasil, adote uma medida exemplar assegurando à sociedade brasileira que não entregará ao nosso convívio social operadores do direito autodeclarados criminosos no que tange a prática de racismo *tomando todas medidas legais cabíveis*.”
Após a intensa repercussão foi criada nesta segunda-feira, dia 4, uma comissão pela Pontifica Universidade Católica para apurar os atos de racismo cometido pelos alunos. ““Após tomar conhecimento, pelas redes sociais, de informações sobre atos de racismo possivelmente ocorridos durante os jogos jurídicos, a Vice-Reitoria para Assuntos Comunitários e o Departamento de Direito da PUC-Rio decidiram constituir Comissão Disciplinar para averiguação das informações e, caso confirmada a veracidade, a apuração e individualização das responsabilidades de membros do corpo discente”, afirmaram em nota o vice-reitor comunitário Augusto Sampaio e o diretor do Departamento de Direito Francisco de Guimaraens.
A Atlética de Direito da PUC postou uma nota de esclarecimento nas redes sociais e disse que “o racismo é uma realidade do país totalmente inaceitável, cujo combate precisa ser uma obrigação de todos os brasileiros comprometidos com uma sociedade mais justa e plural.” Miguel Jost, professor da PUC, conta que os casos de racismo nas universidades de um modo geral não são novos, tampouco surpreendentes como pichações nos banheiros, muros, declarações de intolerância e discriminação racial. Ele ainda observa que o processo do crescimento de denúncias, o que é fundamental para a sociedade de um modo geral, acontece de forma paralela nos últimos 15 anos, da abertura das universidades brasileiras pras camadas menos favorecidas. Ainda relata que medidas cada vez mais rígidas de um ponto de vista pedagógico, são imprescindíveis para combater atitudes discriminatórias como ocorreu nos jogos.
A democratização do espaço acadêmico permitiu as classes mais baixas o acesso ao ensino superior, possibilitando o debate para quebrar paradigmas e fortalecer a luta contra o preconceito. O percentual de negros e pardos entre 18 e 24 anos nas universidades em 2005, um ano após a implementação das ações afirmativas, era de 5,5% e quase dobrou em 10 anos. Em 2015 registrou-se em 12,5% dos alunos negros e pardos matriculados na mesma idade da pesquisa anterior, segundos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).