As instituições republicanas estão sob risco diante do quadro de polarização política e social que vive o país. A luta pelo poder que dilacera a sociedade brasileira e mobiliza valores conservadores morais para legitimá-la tem atravessado as instituições públicas ampliando a desconfiança social em torno dela e afastando-as dos seus objetivos constitucionais.
De fato, os grupos políticos e facções de poder que configuram muitas instituições públicas em todos os níveis de governo têm se aproveitado da instabilidade política e da polarização moral-social para resolverem suas disputas internas pelo controle daquelas, seja contra o processo de democratização que se aprofundava, contraditoriamente, desde a Constituição de 1988, seja pela tentativa de perpetuação no poder institucional.
Essa situação silenciosa tem transformado o espaço de trabalho de muitos servidores públicos num cotidiano de conflitos e disputas que têm impacto sobre a saúde mental e na qualidade da oferta dos serviços, sendo suas primeiras vítimas aqueles envolvidos na organização sindical, estudantil e de crítica à governança institucional.
Grupos políticos que ascenderam por intervenção ou indicação cruzada com apoiadores estratégicos ao Impeachment de 2016 têm patrocinado, utilizando-se da ambiguidade do Direito Administrativo que rege os servidores públicos em suas três esferas federativas, uma verdadeira caça às bruxas, buscando garantir suas posições políticas e os ganhos financeiros via cargos de comissão, cargos de direção e função gratificada.
Sob o discurso da transparência e da justiça, têm instaurado clima de intimidação e medo, assim como gasto dispendioso para o Erário Público, em processos administrativos que se transformaram em tribunais de santa inquisição, visto que não se tratam de investigações equilibradas e isentas, mas de perseguição política escancarada.
Situações e supostas inconformidades administrativas que podem ser mediadas, como já faz a justiça comum no âmbito da comissão ética ou conciliação, acabam sendo transferidas ao âmbito do processo administrativo, o que ocasiona um desvio de funções dos servidores públicos, que não são advogados. E mais: ampliam ganhos, custos, o que não representa sua finalidade.
Na vontade de incriminar, penalizar e excluir adversários, são esquecidos ritos do direito administrativo e atropela-se os direitos civis dos servidores acusados, transformando-os em inimigos das instituições e fazendo das comissões de processo administrativo mero espetáculo de punição e exercício de poder do novo grupo que se coloca como o “dono” daquela instituição pública.
Assim, a instabilidade política e a polaridade político-partidária do país, assomada à cruzada moral e à desconfiança coletiva que pretende transformar todos os servidores públicos e políticos em pró-corruptos, tem alimentado e justificado o que insistimos em chamar de ditadura administrativa nas instituições públicas brasileiras nas quais servidores públicos articulados a grupos políticos em ascensão na nova gestão política federal têm buscado vingar-se dos seus rivais políticos.
Dessa maneira, impulsiona-se um certo desvio das funções públicas e a neutralização dos princípios republicanos, transformando-as instituições-máquinas partidárias e pessoais, sob o discurso do combate à corrupção e as irregularidades administrativas.
Ou melhor, em bankers de interesses particulares onde o principalmente objetivo é o espólio da sua estrutura burocrático-administrativa e o monopólio da sua estrutura de prestígio, poder e dinheiro (recursos públicos). Temos mais interesses institucionais e de facções políticas do que o exercício do a materialização do interesse público.
Ministério Público, sociedade civil e Governo Federal devem olhar com mais cuidado ao processo de politização das instituições públicas e seu peso na ampliação da desconfiança generalizada nas instituições públicas, cujo história e serviço ao povo brasileiro ultrapassaram as conjunturas políticas e os projetos de poder.
Os servidores públicos – nas suas diversas e complexas constituições e hierarquias, não vivem apenas o clima do arrocho salarial e da transformação do bode expiatório da Crise política e econômica do país, como também o clima da perseguição política e moral estabelecida por grupos políticos que apenas tiveram condição de ascender, muitos deles, aos lugares de poder das instituições públicas brasileiras a partir do Impeachment de 2016 e das eleições de 2018.
A marcha da tirania administrativa segue firme num espaço público governado pelas hostis neoliberais e conservadoras, que apenas conseguem avaliar e compreender a vida estatal partir das regras de mercado e seu projeto de consolidação da oligarquização do estado brasileiro, bloqueando os processos de transparência, accountability (responsivização) e democratização, que com todas as contradições e marchas e contramarchas, que marcaram a Nova República (1985-?).
A República é o campo da imperfeição é justamente, por isso, que ela é espaço político em que os diferentes atores sociais buscam, por meio dos processos democráticos – representativo, participativo ou deliberativo, construir valores comuns para avaliarem, orientarem e pensarem suas práticas. Cria-se um ideal de cidadão e homem como funcionar como contrapeso e peso ações dos homens e mulheres, em seus diferentes grupos sociais e projetos de poder, concretos na arena política e social.
Enfim, a clássica regra pedagógica do bem público: Quem vai escolher o pedaço, não corta o pudim. Quem vai cortar não poder escolher… Nesse processo político e social, destacam-se, como fundamental importância, as instituições republicanas e seus servidores públicos. Não podemos seguir confundindo governos com Estado, como bem nos ensina a Constituição Federal de 1988.
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