É, o mundo está mesmo ficando muito chato, as pessoas não querem mais sofrer ofensas caladas. Agora elas botam a boca no trombone com vontade. E isso tudo tá muito chato mesmo, né?
Os negros não aturam mais piadinhas, brincadeirinhas e nem ofensas racistas. Os homossexuais também não querem mais tolerar atitudes homofóbicas, e fazem, mesmo, barulho. E bem alto. E as mulheres, então? Elas agora estão denunciando tudo, e não sofrem mais ofensas, piadinhas machistas e sexistas, cantadas sem nexo caladas, e se rolar agressão, então, botam a boca no mundo sem dó nem piedade do agressor, levando-os para cadeia. As mulheres não querem mais a submissão.
Mas o Mundo tá, mesmo, ficando muito chato. Chatíssimo! Pois agora as vítimas não querem mais permanecer caladas e quietas diante de ofensas disfarçadas de brincadeirinhas, não dão mais moral para os ofensores e agressores. E isso incomoda e irrita muito àqueles que são acostumados a humilhar, maltratar as pessoas que são diferentes deles. Também irrita aqueles que riem, fazem de conta que não veem, até mesmo se calam, sendo cúmplices direta ou indiretamente dos opressores.
Mas que bom que o Mundo está ficando chato, isso é sinal de mudanças, de conscientização. E é bom que essas pessoas aprendam e entendam que EDUCAÇÃO e RESPEITO andam juntos.
#MaisEducação #MaisRespeito
O Mundo não é mais o mesmo! Que saco?! Que chato?!
Escrevi esse texto e publiquei no meu Facebook há 2 anos, após ter ouvido uma conversa de duas madames na fila do supermercado, reclamando da chatice que virou o mundo com uma moça bem jovenzinha. Elas reclamavam por hoje não poderem falar nada, pois na concepção delas tudo vira ofensa, preconceito, machismo e racismos. Este último, então, era o que as duas madames mais reclamavam por não poderem mais praticar livremente, enquanto a jovenzinha prestava a atenção no que elas falavam em tom de voz alto e indignado.
Assim como a jovem, eu também fiquei prestando atenção no que as duas senhoras, brancas, aparentando serem de classe média, falavam. Mesmo não sabendo qual foi o motivo às levou a iniciarem aquela conversa, consegui entender que elas estavam muito insatisfeitas em não poderem mais insultar alguém ou fazer piadinhas comentários ofensivos e preconceituosos. Uma delas chegou a dizer que tinha medo de brincar ou chamar a atenção da empregada doméstica dela, a quem ela se referia como “minha funcionária” e, algumas vezes, “a menina que trabalha lá em casa”.
Segundo a madame, tinha medo de falar algo bobo e ser processada pela empregada, que dizia ser uma pessoa de cor e morar na favela. E dizia: “essa gente toda agora está letrada…” Eu não conseguia parar de encará-las e deixar de prestar atenção na conversa, que transcorria naturalmente, como se elas estivessem na sala de seus apartamentos.
Esse, foi mais um daqueles dias, que mesmo que os anos passem, ficam marcados, não sai da nossa memória e nos lembramos de cada detalhe. E quando esse texto reapareceu no meu Facebook como lembrança, logo me reacendeu desse dia, que aliás, tirando o bate-papo das madames, não foi um dia chato.
Eu prestava muita atenção também no comportamento da jovenzinha, também branca, de pele bem clarinha, que estava entre elas. A menina mais ouvia do que faltava, e as poucas vezes que dizia algo, era para descordar das duas ou explicar-lhes alguma coisa. Sempre falando em tom de voz moderado, diferente das duas senhoras. Nas poucas coisas que ela dizia para as dondocas, era nítida a tentativa dela de convencê-las a mudarem aquele pensamento retrógrado, totalmente atrasado.
Enquanto eu ouvia aquela conversa chata, mas na qual era impossível não prestar atenção, fiquei refletindo e pensando o quanto eu também me tornei uma pessoa chata para essa gente. Eu também não quero mais aturar piadinhas e comentários ofensivos e preconceituosos. Também não quero mais aturar machismo de nenhum macho escroto ou de alguma mulher machista que me ofenda. E percebo que muitos amigos meus também não querem mais aturar a escrotice dessa gente mal-educada e sem noção.
Mas, nesse dia, preferi ficar quieta ouvindo aquele bate-papo informal e não interferir. Percebi que as duas madames queriam provocar algum negro ali presente, ou alguma pessoa LGBT, também presente no local, para elas pudessem destilar todo ódio bastante venenoso que carregavam. Pelo tom de voz alto que usavam, era nítido que queriam plateia, mas tiveram seus planos frustrados, porque ninguém, além da jovem, deu-lhes atenção. Vi essa atitude como forma de um protesto, pois silêncio também é uma mensagem e se faz necessários em determinados momentos. Se elas pretendiam iniciar uma discussão e protestarem pelo direito delas poderem continuarem sendo racistas, homofóbicas, machistas e não serem incomodadas, ninguém deu essa moral a elas, e eu também não. Preferir fazer com que elas engolissem minha presença ali, sem poder fazer nada, pois estava no meu direito também de ocupar um espaço público.
Deixei bem claro que estava prestando atenção na conversa e não iria me manifestar. Não iria entrar naquele jogo sujo, nojento, para duas dondocas poderem aparecer às minhas custas. Não que eu sempre fique calada diante de atitudes preconceituosas, mas naquele momento foi minha melhor forma de me posicionar, não iria valer apena, estragar meu dia, que iniciou tranquilo. Em determinados momentos o silêncio grita alto! E o silêncio das pessoas negras, dos LGBTs, das mulheres, naquele espaço gritou bem alto, pois as duas madames brancas, preferiram mudar de assunto e falar sobre futilidades, porque de assuntos fúteis elas entendem bem. Entendem por serem também pessoas fúteis e, talvez, inúteis. No rosto delas, a expressão de frustração por nenhuma pessoa pertencente às chamadas minorias ter discutido com elas, apenas a jovenzinha branca tentava sem sucesso mudar o pensamento atrasadíssimo delas.
E o Facebook, dias depois, me trouxe mais uma lembrança de mais um protesto que fiz contra o racismo e o preconceito. E não sei se foi o amadurecimento ou se foi o mundo que fez com que eu me tornasse uma pessoa chata. E muito chata!
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