Até outro dia, eu não tinha a menor noção de quem eram Simone de Beauvoir ou Frida Kahlo. Na escola, Clarice Lispector, Machado de Assis e Carlos Drummond de Andrade eram nomes apresentados apenas pela superfície da obrigação literária. Mas e aí? O que isso faz de mim?
O texto a seguir não contém estatísticas comprovadas pelo IBGE ou qualquer órgão oficial de dados no país, mas fala, através da uma ótica um tanto pessoal, sobre uma das possíveis razões que ainda nos levam a acreditar que não somos suficientemente bons quando o assunto é o nosso intelecto.
Toda semana, preciso separar um tema para escrever aqui ou para outros meios de comunicação que me convidam para expor uma opinião sobre determinado assunto que me sobressaia aos olhos. Vez ou outra (quase sempre), isso vira uma questão, já que mesmo tendo vivido entre livros e me aproximado da leitura aos dois anos de idade, quando tive o primeiro contato com a escola, eu tenho minimamente o conhecimento dito necessário. Supõe-se que não é elegante (segundo a sociedade) que, como escritora, meus conhecimentos geraI sejam rasos, afinal, é necessário um repertório profundo sobre os principais nomes da literatura brasileira, líderes negros e ícones feministas.
Dependendo do ambiente que frequente e das pessoas com quem você se relacione, isso chega a ser um absurdo (apesar de recentemente eu ter diminuído a palavra do meu vocabulário por excesso de uso) e é destacado como inerente à nossa vida.
Se, em dois anos, perdemos algumas oportunidades de vivências fora do país por não saber falar inglês fluentemente, por outro lado, nossos amigos aprendem novas línguas em meses como se fosse a coisa mais natural do mundo. Longe de mim trazer aqui uma reflexão de lugar de vítima, mas precisamos falar sobre autoestima intelectual, principalmente na periferia ou em lugares onde a cultura e o acesso à educação ainda chegam de maneira tão superficial. Mesmo que venha com profundidade, ainda encontrará dificuldades que transcende o “Fulano é preguiçoso, burro ou incompetente”.
A autoestima intelectual traz referências ao medo de “ser burra” ou até mesmo travar um diálogo (ou escrita) no qual alguém irá analisar suas habilidades de conhecimento intelectual. É acreditar que seguir um diálogo com alguém mais instruído é praticamente impossível. É agir de forma reativa, por exemplo, toda vez que alguém demonstrar que tem mais conhecimento que você em algum assunto. É ficar gelada quando alguém vai ler seu texto ou até quando é preciso apresentar um trabalho autoral, seja na escola, na faculdade ou no trabalho.
Essa sensação de ser incapaz de produzir algo relevante, atrelada ao dito pouco conhecimento, seja ele literário, acadêmico ou cultural, por exemplo, pode gerar uma série de questões, inclusive relacionadas ao que chamo de autoestima local, quando o lugar onde moramos está totalmente ramificado à crença de que algo melhor não é para nós.
Nos últimos textos da coluna, falamos de evasão escolar, sonhos, sentimentos, cotidiano, perspectiva. Falei de Carolina de Jesus. Mas, se eu disser que foi fácil, eu seria uma farsa.
Seja por uma questão de autoestima intelectual ou não, o fato é que somos seres humanos únicos e seguimos a linha do que aprendemos ao ouvir os mais velhos nos dizerem na infância: “Você não é todo mundo”. Partindo desse princípio, digo que podemos ser capazes de adquirir conhecimento de diversas formas, seja através de canais do YouTube, de encontros com amigos, da leitura de livros, revistas ou consumindo qualquer plataforma que nos faça aumentar nosso repertório para a vida. E tá tudo bem se você ainda não conhecia nenhum dos nomes que mencionei no início desse texto. Essa não é e não pode se tornar uma questão que nos diminua a ponto de criar a sensação de ser menor que alguém, de ser menos capaz – sensação de inferioridade.
Talvez eu e você nunca conquistaremos um prêmio mundial ou sejamos indicados ao Prêmio Nobel da Paz. Quem sabe, sim, cheguemos lá. Mas essa não é nem de longe a motivação capaz de nos fazer continuar. Essa sede pelo aprendizado e pelo conhecimento pode traçar vários caminhos na vida de cada indivíduo. Se ainda não encontramos a resposta, o importante é fazer o percurso encontrar o caminho.
“À plus tard”, “hasta luego”, “see you”, até mais, e viva o Google Tradutor. Por falar nisso, que tal começar por pequenas doses e chegar a lugares mais altos com substância? Fica a dica.