“Eu escrevo poesia porque as pessoas precisam ouvir o que meu povo tem a dizer”. Assim descreve a poeta, cantora e mobilizadora cultural Bruna Silva @brunasilvapoesia, mulher preta e lésbica, a respeito do seu primeiro livro autoral de poesias “Èsù Walê – O Caminho de Volta”, a ser lançado no próximo dia 13 de janeiro, às 19h, na Casa do Benin, em Salvador, com distribuição gratuita de exemplares. A publicação, que já está disponível em audiobook e conta com a direção de voz de Reinan Acioly, traz escritos encruzilhados nas ruas da periferia, para falar de afeto, força e da ancestralidade que a afirma e a faz (re)existir, palavras aquilombadas que vão alimentar o mundo.
As poesias em denúncia de Bruna Silva demonstram os caminhos que a escritora e o povo preto já não desejam percorrer, mas que também nos apresentam os caminhos desejosos que a vida pode vir a ser. Uma de suas poesias, escrita em parceria com o poeta Evanilson Alves, fala: “A palavra é nossa arma / Contra toda opressão / A poesia que não se cala / Dá voz a toda uma geração / (…) / Nosso fazer vai além do artístico / É conhecimento, exemplo e motivação / Que a poesia toque os corações / E na perifa gere transformação”.
“As minhas poesias nascem e se fundamentam nas encruzilhadas, das ocupações do meu corpo, nas batalhas de slam, das pessoas que estão no meu entorno. Por isso, elas ganham às ruas, pois esse é o tempo-espaço delas. As escritas surgem a partir dos caminhos que sou e ocupo”, reitera a escritora, que ganha sua primeira batalha no Slam das Minas, em 2018.
Bruna Silva acrescenta que o processo de ocupação das poesias escritas e declamadas nas ruas para a fisicalidade do livro nasce de um incentivo de seu irmão Igor Tiago. “O livro vem para afirmar que a minha arte é possível estar nesses lugares. Èsù Walê representa esse caminho que me diz onde, como e por que devo estar. E, principalmente, de onde não quero sair”, declara a poeta, que completa 10 anos de criação artística.
A poeta, que muito já declamou seus escritos nos buzões soteropolitanos, festivais literários e nos slams, apresenta ao leitor o caminho de (re)encontro ancestral, de fortalecimento de Ori, fala dos amores e desencontros, da maternidade solo, de família sangue e de quilombo. Palavras para “Se conhecer / Se perdoar / Se refazer / Se organizar / Não parar / Trilhar o nosso próprio caminho / Com a certeza de que nenhum de nós está sozinho / Acompanhado / Sempre ao lado do sagrado / Entendendo o certo e o errado”. Escreve a filha de Exú, assentado no Ilê Axé Bará Lajiki Omin – Axé Walê.
Ela realça que o livro mostra “aos meus” que é possível falar sobre o que acreditamos. “Que a partir da nossa arte e poesia é possível encontrar e aproximar pessoas. Por isso, lanço este livro, em que através das poesias e poemas descrevo o caminho que refaço para encontrar o sagrado, de dizer a Exu que estou aqui. Nele escrevo sobre o colo de um pai que nunca tive, mas falo de um pai que apareceu quando tinha que vir. Èsù Walê é uma forma de dizer a mim mesmo que eu não me perca, pois tenho quem me ampare”.
Para a jornalista Vânia Dias, que presenteia o livro com um lindíssimo prefácio, através das poesias “é possível ouvir gritos e sussurros. Medos e coragens de quem se sabe malabarista da arte da sobre(escre)vivência”. E, se preciso for, quebra a rima, escreve poemas e poesias livre de amarras e ou de regras. “Na velocidade do vento, a menina Silva escreve como se, nesse encontro de páginas nuas, vestisse de palavras os cenários das ruas”, descreve Vânia Dias.
“Èsù Walê – O Caminho de Volta é um megafone para falar sobre as várias faces e demandas que nós pretos e de periferia lidamos durante a vida. Ele também é um levante psíquico e poético, para dizer que nós estamos vivos, fazendo arte, transformando os nossos. É através dele que escancaro as facetas do racismo e aqui exacerbo o que cotidianamente enfrentam os no campo literário”, acrescenta Bruna Silva.
Em sua escrita posfácio, a pesquisadora literária Amanda Julieta descreve que Bruna Silva traz em seu livro “Uma poesia dita em pretuguês, como pontua Lélia Gonzalez, essa língua de encruzilhada, marcada pela africanidade; uma poesia feita com caneta e papel, mas também de voz, gestos, gritos, sorrisos, olhares, silêncios; uma poesia para ser compartilhada coletivamente, como um quilombo de palavras onde tudo que se dá se recebe, seguindo o princípio da reciprocidade de Èsù.”
O livro, dividido em quatro capítulos com 26 poemas no total, conta com ilustrações assinadas pelo artista Lee 27. A capa exusíaca foi desenhada por Maria Clara Duarte. O projeto gráfico do livro é de Duda Rievrs e a revisão é do poeta-performer Alex Simões. Já o prefácio é escrito pela jornalista e comunicadora social Vânia Dias. A direção e coordenação do projeto são de Igor Tiago (seu irmão) e de Herley Nunes, respectivamente. Vale pontuar que, após o lançamento, o livro será vendido diretamente pelo perfil @brunasilvapoesia ou pelo site Amazon.
O livro “Èsù Walê – Caminho de Volta” foi contemplado nos Editais da Paulo Gustavo Bahia e tem apoio financeiro do Governo do Estado da Bahia através da Secretaria de Cultura via Lei Paulo Gustavo, direcionada pelo Ministério da Cultura, Governo Federal. A Paulo Gustavo Bahia (PGBA) foi criada para a efetivação das ações emergenciais de apoio ao setor cultural, visando cumprir a Lei Complementar n° 195, de 8 de julho de 2022.