Carta às Minhas

Marielle Vive, Pretas em Luta!
Foto: Blenda Santos

Irmã,

Hoje eu levantei, olhei pro lado e não te vi. A cama arrumada denunciava mais uma noite sem dormir. Abri a porta e caminhei até a sala. Você não estava. Fui até a varanda e percebi que já faz sete dias. Há sete dias você se foi, irmã. Eu sei que o mundo foi duro com você. Quando você nasceu, quiseram te colocar um vestido rosa e você chorou. Quiseram furar sua orelha, você não deixou. Mandaram você cruzar as pernas: “Mocinha tem que se comportar!”. Você retrucou. Não podia jogar futebol, lançar o anzol e andar por aí. Perguntavam se queria companhia. “Mulher sozinha não deve sair!”. Você abortou e ninguém ligou, porque seu corpo marginalizado ‘não sentia dor’. Café, cafuné e massagem no pé. “Seu marido deve ter o que ele quiser”. E eu te olhava de longe, sem saber, ao certo, se me preocupava. Ao ouvir seu grito, corri pro portão. Seu filho estirado no chão. O sangue pintava a calçada. Ninguém viu nada. Não compreendia o teu sofrimento, mas era um tormento só ao te olhar. E eu te perguntava: “quem é esse que nos abandona?”. E você dizia, “Oxum vai nos guiar”. Sua fé era tão bonita que até ateu chegou a acreditar. Mas eu não entendo, por que foi embora? Já perdi as horas a te aguardar. Chega o carteiro. Entrega uma carta. Uma carta sua. O que esperar? Ao abrir a carta, uma frase sua, com a sua letra e seu patuá:

Quando você pensar em desistir irmã, lembra de mim!

Às minhas irmãs.

De sangue, de luta.

Obs.: Essa carta não é sobre A Marielle Franco, é sobre AS Marielle Franco.

Existimos e Resistimos!