Cartão quebra-galho ajuda famílias nas favelas cariocas

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Durante a pandemia muita gente que ainda não conhecia a organização da favela passou a conhecer com os diversos projetos e ações que estão acontecendo. Um desses exemplos é a iniciativa da Marginal Coletivo em parceria com a Organização Brasil Foundation que criaram o “Cartão quebra-galho”. De acordo com Jota Marques, criador do projeto e coordenador do Marginal Coletivo, a ideia do cartão surgiu como uma maneira de dar independencia financeira paras as famílias em vulnerabilidade social nas favelas.

“Quando olhamos para os auxílios, muitas vezes já vem ali determinado como a família pode usar o dinheiro ou os recursos que está recebendo, nós somos contra isso, a gente quer fortalecer a ideia de que as famílias precisam ter autonomia suficiente com pouco ou muito dinheiro pra definir o que é necessário, urgente e importante para ela naquele momento”, disse Jota.

Foram produzidos 3650 cartões que recebem uma carga única com o valor de 100 reais, que a pessoa pode usar para o que ela quiser, seja para comprar comida, comprar o gás, pagar uma conta… “Quando a gente tava doando as cestas básicas nesses meses, vimos situações de todos os tipos, a maior parte precisava de comida, mas tinha gente que já tinha comida mas não tinha o gás para fazê-la, também vimos pessoas que tinham comida e gás mas não tinham panela ou fogão, gente que não tinha energia. Então essas coisas aconteceram o tempo inteiro e dependendo como se utilize o cartão também consegue fazer o pagamento de conta”, explicou o coordenador.

Morador da Cidade de Deus, zona oeste do Rio de Janeiro, ativista e conselheiro tutelar licenciado de Jacarépagua, Jota viu no cartão uma maneira de expandir a ajuda para outras tantas favelas pelo Rio. “Me comuniquei com diversos coletivos parceiros e eles toparam a ideia de ser um cartão que nomeamos de “quebra galho” que é uma brincadeira, um nome pra trazer uma provocação porque é um quebra galho mesmo. Mas é um quebra galho partindo de uma iniciativa independente dentro da favela e pensando na autonomia financeira”, contou. Além disso Jota afirma que o cartão tras uma reflexão sobre a mobilização e organização da favela e sobre como essas mobilização seriam ainda mais evidenciadas se tivesse um apoio do governo. “A gente consegue se mobilizar, se organizar e ser mais efetivo com os nossos do que aqueles que prometeram que cuidariam da gente”, alertou.

Os cartões estão sendo distribuídos em cerca de 15 favelas na cidade do Rio de Janeiro em parceria com coletivos e instituições de base comunitária. A Marginal Coletivo entrega os cartões para esses parceiros e dalí em diante como esses cartões serão distribuídos fica como decisão de cada coletivo. “A Frente CDD, por exemplo, faz o cadastro de porta em porta e depois combina por telefone o horário pra pessoa ir pegar o cartão”, disse Jota. O cartão funciona em qualquer maquininha que aceite a bandeira mastecard, o seu cadastro é feito por meio do aplicativo “Social Wallet”. “A pessoa baixa o aplicativo aí alí ela já escolhe a senha e ativa o cartão pra uso e pode acompanhar o gasto do cartão também pelo aplicativo”, explicou Jota.

De acordo com Jota essa atitude de “não colonizar a vontade do outro” é o que mais assusta as pessoas que recebem o cartão. “O susto sempre é o do poder comprar algo diferente, e esse diferente continua sendo o básico, como a gente já recebeu relatos de pessoas que dividiram os 100 reais do cartão para comprar linguiça, asa de frango, ovo e salsicha. Então não é nada demais, mas é a possibilidade de ter algo que não foi possível ter ao longo desses meses”, contou.

Quando questionado da possibilidade de ter uma segunda remessa de cartões Jota afirma que se houver condições de continuar eles continuarão, porém acha difícil ao observar a estrutura social atualmente. “Com o retorno das pessoas pras ruas é como se elas não tivessem mais precisando, mas a gente também sabe que as pessoas não passaram a precisar na pandemia, elas já precisavam antes. Então estamos nos colocando como: a gente precisa continuar cuidando das pessoas e precisamos de ajuda para fazer isso, se será pelo cartão ou por outra iniciativa não sabemos, mas queremos construir”, contou.

O ativista afirmou que do começo da pandemia até agora viveu muitos altos e baixos, mas que hoje se sente cada vez mais furioso e estimulado a pensar que a transformação da cidade vai partir da favela. “De um lado meu sentimento é de tristeza porque perdemos milhares de pessoas mas por outro é de que eu preciso continuar, em memória e ao dever de honrar as pessoas que partiram e de continuar construindo, insistindo e chamando atenção para os nossos problemas e continuar também jogando holofotes nas nossas soluções que são criadas na base, ao lado das pessoas”, completou.