Em meio aos alardes midiáticos, a população carioca segue sua vida normalmente, demonstrando não temer a pandemia global vigente. Dentre os possíveis motivos, podemos apontar o cotidiano catastrófico de nossa gente, ou mesmo a intimidade com o caos que circula as favelas e periferias da Região Metropolitana.
Embora todas essas possibilidades sejam reais, em verdade o novo coronavírus (COVID-19) assusta muito mais aqueles que têm uma vida de movimentos espaciais mais constantes e em escalas maiores. Não por acaso, saiu esta semana (dos aproximadamente 80 casos confirmados no Brasil) que o Presidente da República sinalizou positivo em seu primeiro teste para o vírus, atestando negativo em seguida, logo após uma viagem ao exterior. Isso nos mostra que, nesse momento, a população mais pobre da metrópole é muito mais refém do acesso ao sistema público de saúde de que o contato em primeiro grau com possíveis infectados. Buscar informações, mudar os hábitos de higiene, e até alimentares, são muito mais pertinentes ao passo em que a histeria aos poucos vai alcançando o todo social.
Instituições de ensino, eventos públicos em diferentes esferas, como o futebol, aos poucos vão tendo seus calendários alterados como medida preventiva. O mercado global passa a ser afetado, aqueles que dependem de vendas e movimento para ganhar dinheiro também são. Hoje, no Brasil, aproximadamente 12 milhões de pessoas estão desempregadas, dependendo assim de trabalhos informais. Um dos mais comuns é o cadastro em aplicativos de celular de prestação de serviço. A Uber, empresa multinacional americana, tem aproximadamente 850 mil motoristas e entregadores parceiros no Brasil, segundo seu site oficial. Caso a sociedade realmente diminua significativamente seu fluxo de dinheiro e pessoas na rua, diversas mães e pais, chefes de família, estarão abandonadas pela empresa, vista anteriormente como geradora de empregos, mas que nesse momento não terá responsabilidades sociais com essa parcela de trabalhadores.
Um filósofo famoso, Slavoj Zizek, esloveno, escreveu artigo vendo um possível “poder subversivo” do vírus para a população, que será obrigada a repensar suas práticas culturais e econômicas. Eu apenas temo, pois, vivendo no Rio de Janeiro há tantos anos, conhecendo bem o sistema de saúde público, imagino que quando passarmos a ver mais de perto os casos confirmados da doença, os pobres da cidade correrão grande risco. Por agora nos resta pressionar os responsáveis pela saúde pública, pois é imprescindível que estejamos preparados.