“Tive que desistir porque a professora de estágio só aceitava que a turma fosse na Zona Sul”. Esse e outros relatos de elitismo e discriminação estão na página Marginais da UFRJ, criada por alunos cotistas e moradores da periferia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A página já alcança 10 mil curtidas no Facebook.
Histórias de preconceito sofridas por alunos pobres em universidades consideradas de elite são temas de diversas páginas nas redes sociais, como é o caso da Bastardos da PUC. Em 2012, com a sanção da Lei de Cotas (12.711), que estabelece uma reserva de 50% das vagas nos processos seletivos de universidades e institutos federais para alunos que cursaram todo o Ensino Médio na escola pública, a UFRJ passou a resguardar mais de duas mil vagas para alunos cotistas (50,02%).
Apesar de não haver muita diferença entre o desempenho de alunos cotistas e não cotistas, as disputas sociais se acirraram e são diversos os casos de abusos protagonizados pro professores e alunos. Piadas sobre as origem dos estudantes e até a exigência de trabalhos que requerem um alto custo financeiro para o seu desenvolvimento são temas mais comuns na Marginais da UFRJ. O grupo fundador é composto por alunos cotistas e não-cotistas das zonas Norte e Oeste do Rio, e surgiu em um contexto conturbado na própria instituição após o assassinato homofóbico do aluno Diego Vieira Machado, de 30 anos, no campus da Ilha do Fundão, em maio do ano passado.
“O ambiente da UFRJ é bastante opressor aos alunos pobres que estão à margem da faculdade”, explica Ericka Lourenço, 20, estudante de Comunicação Social e uma das fundadoras da página. A página surgiu como um projeto do Laboratório de Comunicação e Ativismo, um espaço da Escola de Comunicação feito por estudantes. A rotina de dificuldades dos alunos é, muitas vezes, motivo de piadas para os muitos filhos da elite que estudam na universidade, então, foi necessário criar um espaço que desse eco a outras vozes.
Mesmo com a bolsa-permanência oferecida pelo Estado a muitos estudantes, diversos alunos relatam que os gastos altos com transporte, alimentação, xerox, livros e trabalhos dificultam a continuidade dos estudos. Isso torna o ambiente excludente, na opinião de Ericka: “O aluno pobre não desenvolve um sentimento de pertencimento e ainda é silenciado por muitos quando abre a boca para falar de suas dificuldades”.
Os alunos mais vulneráveis socialmente também precisam lidar com grupos autodeclarados de direita, que discriminam gays, negros, cotistas, mulheres e pessoas com orientação política de esquerda. “Esses são os ‘marginais da UFRJ’, pessoas à margem da faculdade que lutam diariamente e resistem, não desistem e não vão se calar”, conclui a estudante.
Confira na galeria alguns dos relatos recebidos pela página.