Em mais uma ação considerada pelo movimento negro carioca como um ataque à cultura afro, o prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, vetou nesta quinta-feira (28) o Projeto de Lei nº 346, que tornava o Quilombo da Pedra do Sal e a Roda de Capoeira do Saravá patrimônios imateriais da cidade. A decisão foi publicada no Diário Oficial do Município.
Situado na Zona Portuária do Rio, era ali que escravos africanos descarregavam sal importado de Portugal. Foi naquele local também que nasceu a região da Pequena África, principal reduto da comunidade afro-brasileira no Rio, e onde surgiram e a ainda acontecem diversas manifestações culturais da cidade, como ranchos carnavalescos e o samba.
Tanto a Capoeira do Saravá, realizada no Meier, quanto a Pedra do Sal são consideradas símbolos da cultura negra e da ancestralidade afro que há no Rio por conta da escravidão. O Quilombo da Pedra do Sal, junto com o Cais do Valongo, o Cemitério dos Pretos Novos e o armazém Docas Pedro II foram, juntos, considerado patrimônio da humanidade pela Unesco em 2017.
Ao vetar o projeto, Marcelo Crivella deu uma justificativa administrativa, informando que não cabe ao legislativo municipal determinar esse tipo de classificação. “O ato de reconhecer um bem imaterial como patrimônio cultural carioca é matéria que está afetada ao Poder Executivo, inexistindo qualquer traço de generalidade e abstração que possa suscitar o exercício da competência nuclear do Poder Legislativo”, disse.
Por outro lado, o vereador Fernando William (PDT), um dos autores da proposta, questionou o argumento do prefeito. “O que tem ocorrido é que praticamente todos os processos da Câmara dos Vereadores são vetados com base na mesma alegação de que não é competência nossa, registros de natureza administrativa. Ou é retaliação, com base nas minhas últimas decisões em votações, ou é um ato incoerente. Não tem sentido você vetar uma área de proteção cultural com base nessa justificativa”.
A medida acirra ainda mais a série de atritos envolvendo o chefe do executivo da cidade e bens imateriais referentes ao movimento negro no município. No ano passado, a prefeitura do Rio e a Secretaria municipal de Cultura suspenderam o patrocínio do Jongo da Serrinha, tombado em 2005 pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) pelos 50 anos dedicados à preservação do jongo como Patrimônio Imaterial do Sudeste.
A manutenção do veto de Crivella ainda precisará ser analisada pelo legislativo municipal.