Se tem algo que movimenta a internet são as tretas. No rap, isso nunca faltou, e com a dinâmica do mundo, elas ganham as redes sociais, os sites de notícias e o assunto das rodas de conversa do seu público. No momento atual, inclusive, tem ocorrido bastante.
No ano passado, Baco Exu do Blues e Diomedes Chinaski se projetaram nacionalmente atacando rappers do RJ e SP, falando da falta de espaço do nordeste na cena nacional através de “Sulicídio”, hit de 2016. O carioca BK e o mineiro Djonga foram mais diretos com Predella, integrante do Costa Gold.
A última foi de Raffa Moreira contra Pedro Qualy, do grupo Haikaiss, ambos de São Paulo. A confusão começou com uma série de tweets de Raffa criticando o fato de o grupo ter somente integrantes brancos, assim como coletivo de maioria branca Damassaclan, e fazerem sucesso com um ritmo criado pela população preta. Pedro Qualy respondeu, dizendo que Raffa estaria passando vergonha. Na sequência, Qualy publicou um print de Facebook em que mostrava uma foto antiga de Raffa como integrante de uma banda emo, com músicos brancos. O fato mais inusitado dentre as tretas da cena do rap é que essa chegou à grande mídia através da página do Lollapalooza no site G1. O Haikaiss é uma das atrações no festival. E é daqui que a gente aprofunda o olhar.
Existem dois pontos para se observar o quadro: partindo do principio que polêmicas no mundo virtual chamam a atenção para as partes divergentes, ter como mantra o “falem bem, falem mal, mas falem de mim” é sorrir em meio a essa situação. Nesse contexto, não é a denúncia do racismo no rap brasileiro que é a questão, mas usar da questão do racismo para chamar a atenção para si e para seu trabalho. É bom lembrar que existem agências que trabalham a imagem de celebridades usando pautas que estão em grande discussão no momento do mundo, como questões de gênero, por exemplo. O intuito é se aproximar de um determinado público-alvo, aumentar o lucro e se relacionar melhor com quem o consome.
Outra olhar que podemos ter é: quando um preto expõe o racismo, ele é tido como o louco, o que pode gerar isolamento e consequentemente enlouquecimento real. É fato que a juventude branca e de classe média tem ouvido mais rap e trazido a sua narrativa para o gênero musical. Porém, o preto não ter protagonismo em um ritmo que amplifica a sua voz é mais um sinal do racismo estrutural em que estamos inserido.
Continuo sem acreditar em projetos de mudança que não tenham como liderança gente preta, indígena, favelada ou LGBT.