Debate sobre saúde mental é realizado no Complexo do Alemão

Roda de conversa:Vamos falar sobre suicídio? Créditos: Coletivo Papo Reto.

Por Jéssica Pessôa e Thaynara Santos

No último sábado, 25, uma roda de conversa na Clínica da Família Zilda Arns, no Complexo do Alemão, tocou em um assunto que ainda é tabu. O debate “Vamos falar sobre suicídio” promoveu a discussão sobre saúde mental dentro das favelas. Produzido pelos moradores e militantes do Alemão Carolina Marinho e Raull Santiago e as parceiras Isabela Reis e Flávia Oliveira, o debate teve apoio da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Associação Brasileira de Psiquiatria, CVV – Centro de Valorização da Vida e Coletivo Papo Reto.

Segundo a coordenadora regional e porta-voz do CVV Maria das Graças Araújo, o suicídio é considerado pelo Ministério da Saúde um problema de saúde pública. Estima-se que ocorra um caso por hora no Brasil. Mais de 90% deles poderiam ser evitados se houvesse prevenção e discussão sobre esse tema.

Foi a partir disso que nasceu a mobilização para o debate. A ideia surgiu a partir das postagens do midiativista e um dos fundadores do Coletivo Papo Reto Raull Santiago e da jornalista e comunicadora comunitária Carolina Marinho a respeito dos casos de suicídio ocorridos recentemente na favela – dois em um único fim de semana. A jornalista da Globonews Flávia Oliveira os procurou para pensar um encontro com moradores, especialistas e interessados no assunto.

 

Da esquerda para direita: Lúcia Cabral, Pedro Strozenberg, Flávia Oliveira, Antônio Geraldo da Silva, Álvaro Nascimento, Raul, Raull Santiago e Carolina Marinho. (Créditos: Coletivo Papo Reto)

 

A manhã de conversa contou com a participação de especialistas e estudiosos de diferentes áreas, que deram pontos de vistas diferentes sobre o assunto. Integraram a mesa mediada por Flávia o psiquiatra e Presidente da Associação Psiquiátrica da América Latina (APAL) Antônio Geraldo da Silva, o professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e historiador Álvaro Nascimento, a coordenadora Regional RJ-ES do CVV Comunidade e porta-voz do CVV (Centro de Valorização da Vida) Maria das Graças Araújo e o ouvidor-geral da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro Pedro Strozenberg.

Carolina Marinho contou que esse é um tema pouco falado e difícil de vir a público. Mas que, quando surgiram casos de suicídio no Alemão, ela ficou muito assustada com essa situação. Já que a imprensa não fala sobre o assunto sob o pretexto de não incentivar que outras pessoas o façam, ela começou a pedir ajuda a algumas pessoas. Alguns jornalistas se esquivaram de falar sobre esse assunto.

Pedro Strozenberg destacou a importância de eventos como esses: “A roda tem esse valor, esse desafio de romper esses tabus e paradigmas e nos permitir tratar publicamente um tema que precisa ser tratado pelo público, pelo coletivo. E quanto mais formos falando sobre ele, melhor será nossa capacidade de enfrentar de tratá-lo”.

Já Álvaro Nascimento abordou em sua fala as consequências de uma sociedade pontuada pelo preconceito e o quanto isso pode afetar não só coletivamente, mas individualmente a saúde física e mental dos cidadãos.

– Tendo-se um padrão, isso é terrível, porque, quando te enquadram, começam a te encaixotar de uma forma que você começa a ver que não pode sair daquele caixote. Isso é muito opressor. Está na televisão e em vários os lugares. Esse encaixotamento é uma forma de observarmos como é que esse processo se dá. Então, questões como raça, sexismo, roupa, renda, sexualidade, idade, vão dizendo qual é o seu lugar, diz o historiador.

A dificuldade de acesso e a falta de profissionais disponíveis para o atendimento de saúde mental na comunidade também foi um dos pontos levantados durante a discussão. “A gente não tem quem nos escute. A gente se sente perdido em um local onde a gente sofre violência de todos os tipos o todo tempo. Eu fico muito angustiada quanto a isso. A saúde mental pede socorro. A gente precisa de muito mais, precisamos de paz”, afirmou a moradora Lúcia Cabral.