Depois da perda de suas casas, amigos e familiares, agora, as vítimas das chuvas de abril em Niterói estão ameaçadas de perder o abrigo situado no 4º Grupo de Companhias de Administração Militar (G-CAM), no Barreto. A Prefeitura mobilizou nessa terça, 4 de janeiro, um operativo de Defesa Civil, Guarda Municipal e Polícia Militar para transferir essas famílias para o abrigo do 3º Batalhão de Infantaria do Exército (3º BI), em Venda da Cruz, São Gonçalo. Os moradores abrigados no 4º G-CAM se recusaram a sair e se aglomeraram na frente do abrigo em protesto até os representantes do poder executivo desistirem da remoção forçada. Em nota oficial, o prefeito Jorge Roberto Silveira mostra que não abrirá mão do fechamento do abrigo: “a Prefeitura de Niterói esclarece que a medida será retomada tão logo estas famílias compreendam as vantagens da mudança de abrigo.”
Os moradores se indignaram com o desrespeito e autoritarismo do governo municipal que queria forçar a transferência sem nenhum diálogo prévio. Cansados de serem jogados de um lado para o outro, as famílias não querem deixar o 3º BI. Também alegam que no G-CAM ficam em quartos fechados com paredes de cimento e no BI ficariam em piores condições, em espaços mais apertados, menos seguros e protegidos por divisórias de tapumes.
O Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro (MPE-RJ) entrou, também nesta terça-feira, com uma ação civil pública para impedir a transferência desses moradores para outro abrigo público. O MP concorda com o posicionamento dos desabrigados e questiona a postura da prefeitura de Niterói insiste em permanecer “realocando as vítimas das chuvas de abrigo para abrigo” e não garante um lugar fixo para elas morarem.
No fim da tarde, a Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania do Núcleo Niterói conseguiu liminar para evitar que os ex-moradores do Morro do Bumba, do Beltrão, Teixeira de Freitas, Caramujo e de outras áreas afetadas pelas chuvas de abril do ano passado sejam removidas à força do 4ºGCAM. A justiça também exigiu que a Prefeitura, num prazo máximo de 180 dias, implemente as medidas necessárias para o atendimento às famílias dos dois abrigos oficiais, identificando as demandas assistenciais e de moradia deste contingente.
Moradores protestam e prefeitura recua
Na manhã dessa terça, dia previsto para desocupação, os desabrigados organizaram uma ação de resistência em frente ao portão. Fecharam o acesso com correntes e cadeados, estenderam cartazes e se perfilaram formando uma espécie de barreira humana. A mobilização parece ter surpreendido a prefeitura. Com o apoio do Comitê dos Desabrigados de Niterói e outras organizações solidárias, como o Movimento dos Trabalhadores Desempregados, o Conselho Comunitário da Orla da Baía, o Sindicato dos Trabalhadores da UFF e a Pastoral da Juventude, abriu-se uma negociação com os representantes da Polícia Militar e da Defesa Civil.
O coronel Adilson Alves, secretário de Defesa Civil do município, tentou justificar a operação com o argumento de que facilitaria a gestão por parte da prefeitura aglutinar os desabrigados num espaço só: “unificando as ações temos a possibilidade de melhorar a segurança e outros serviços. O objetivo maior é mantê-los vivos, da melhor forma possível. Mas não vamos reformar porque não faz sentido investir em infra-estrutura do que não é da prefeitura.”
Mesmo com o grande número de policiais e viaturas, o tenente Rodolfo Leitão, da Polícia Militar, declarou que não haveria remoção forçada: “a polícia precisa mostrar sua força, mas não precisa aplicar. Não vamos usar força para retirar ninguém hoje.”
Os moradores discordam dessa idéia. Eles se mostram descrentes no empenho do poder público e baseiam essa análise no descaso em que se encontram os dois abrigos. A Prefeitura retirou os serviços de atendimento médico, a limpeza e a segurança. A comida oferecida recebe inúmeras críticas. “O prefeito parece que quer esconder o nosso problema e não resolver. Estamos com o aluguel social atrasado há mais de um mês. Até hoje a defesa civil ainda não deu o laudo da minha casa e vem aqui querer expulsar a gente. Não vamos sair. Não queremos ir para o 3º BI. Queremos sim que a Prefeitura construa nossas casas, e enquanto isso não acontece tem que garantir o mínimo de dignidade para vivermos aqui no abrigo” – relata Simone de Oliveira, 31 anos, uma das abrigadas no G-CAM.
Moradores preparam pauta de reivindicação
Numa reunião feita logo após a desistência da Prefeitura em consumar a remoção, os moradores constataram a necessidade de se organizar melhor. Tanto para a luta política pelo direito à moradia, quanto para o cuidado do espaço em que estão vivendo. Animados com a vitória parcial por se manterem no abrigo, terminada a reunião, foram logo se dividindo em tarefas. Uns começaram a listar os problemas de estrutura do abrigo, outros pegaram rodos para escorrer a água da chuva que alagava o salão. Alguns jovens subiram até no telhado, bem alto, para tentar consertar os vazamentos.
Nessa tarde de quarta, 5 de janeiro, às 16h, os desabrigados do 4º G-CAM realizam uma assembléia para debater a proposta de transferência apresentada pela Prefeitura e organizar uma comissão para se reunir com a Secretaria de Defesa Civil. A idéia é nessa plenária listar os problemas do abrigo, as medidas de apoio necessárias por parte da Prefeitura e pensar uma divisão de tarefas para melhorar a organização dentro do G-CAM.
Fonte: Agência Petroleira de Notícias
Fotos: Rafael Duarte / Agência Petroleira de Notícias
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