O texto tem o intento de causar reflexão sobre a História política do Brasil, a dinâmica de poder, e as lutas sociais que marcam a República desde sua Proclamação até os dias atuais. Ao abordar temas dinâmicos como a participação do povo nas decisões políticas, a resistência das classes populares, as tensões entre diferentes grupos sociais, as manipulações de poder e a luta por representatividade.
A Proclamação da República, retratada na famosa pintura de Benedito Calixto, apresenta um momento de transformação política no Brasil, onde a elite militar e civil assumem o poder, mas o povo, que deveria ser o verdadeiro sujeito da “res pública”, está invisibilizado. A ideia de uma “coisa pública”, ou seja, um regime político que deveria representar os interesses de todos, fica distante da realidade brasileira, na qual os interesses das elites predominam. Fato ratificado na pintura do quadro da independência de Pedro Américo, onde o povo é retratado como passivo (à margem) e distante, simbolizando em ambos o distanciamento entre as massas e o poder político.
A surpresa de que o primeiro presidente da República fosse um militar não trouxe novidade, dado o forte protagonismo das Forças Armadas no processo de transição política. No entanto, o que não estava previsto pelos militares era que, ao tomar o poder, eles também entrariam em um processo de disputa interna que perduraria na política brasileira até os dias de hoje. A resistência popular, embora representada por movimentos como Canudos, Contestado, e Revolta da Chibata, foi muitas vezes ignorada ou reprimida, devido à desorganização e falta de recursos dos resitentes. A luta por reconhecimento e justiça social esbarrou muitas vezes, na força do poder militar e das elites políticas.
A resistência popular, especialmente das classes marginalizadas (negros, pobres, indígenas), é um tema central a ser aprofundado nos diversos contextos históricos, ressaltando os verdadeiros herois dessa resistência. Podemos destacar a figura de José do Patrocínio, um abolicionista negro, símbolo de resistência, especialmente em uma época onde as elites viam a escravidão como uma instituição que deveria ser mantida. A abolição embora tenha sido dado como um marco de liberdade, não resultou em inclusão social e econômica para os negros, o que gerou um ciclo de resistência contínuo, violentamente reprimidas, mas que nunca desapareceram.
Proclamação da República: Benedito Calixto
Decolonizar significa um conjunto de práticas, que visam reduzir ou reverter os efeitos da colonização nas sociedades. Hoje a ideia de decolonização é fundamental para compreender a forma como as comunidades brasileiras buscam se afirmar e resistir às imposições externas, seja na política, na cultura ou na economia. A decolonização não se refere reativa apenas ao domínio físico, mas ao domínio do saber, da cultura e das narrativas históricas. Movimentos como o carnaval, a capoeira, a música e a gastronomia refletem uma resistência cultural, que busca afirmar a identidade das populações marginalizadas emais ainda rsegatar a originalidade apagada. Essas expressões populares são, portanto, formas de resistência e de busca por dignidade.
A batalha em torno das informações têm sido formas também de resistência, a ação da população através dos “coletivos populares”, em mobilizar, reunir e/ou produzir informações nos próprios ambientes da comunidade, se mostra eficiente e bastante salutar para que essas comunidades não sofram interferência de informações distorcidas e desconstrutoras de sua realidade. Além disso, que façam sentido e falem a respeito daquilo que a interessa. Impedindo a massificação e a distorção de informações que possam ser usadas como armas poderosas de domínio ou de moeda de lucro, de grupos dominantes na manutenção do poder da narrativa.
No ambiente externo, não podemos deixar de fazer crítica ao papel de potências estrangeiras, como os Estados Unidos, na interferência da política interna do Brasil, especialmente no que diz respeito à Amazônia, como acontecido no passado em que teve participação nos golpes de estado, de grande parte da américa latina. A ideia de que a “ajuda” oferecida a países em desenvolvimento muitas vezes serve para esconder interesses econômicos e geopolíticos mais profundos, sempre foi uma constante na história das relações internacionais. O exemplo do tratamento desigual entre investimentos em Israel e a Amazônia ilustra bem a manipulação da narrativa política em favor de interesses estrangeiros, sem levar em conta a real preservação ambiental ou o respeito pelas populações locais.
A precarização do trabalho como tema de fundo das principais reivindicações trabalhistas, especialmente com propostas como a redução da carga horária para trabalhadores, reflete um problema social aprofundado no Brasil: a divisão entre as classes sociais e as diferentes condições de trabalho. A classe política, por exemplo, com sua carga horária reduzida e privilégios, está muito distante da realidade dos trabalhadores que enfrentam jornadas exaustivas e condições de trabalho precárias. Isso reflete as desigualdades estruturais do país, onde os mais pobres têm poucas chances de ascender socialmente e os trabalhadores são explorados em diversos setores.
Independência ou morte: Pedro Américo
Encravado em um dos bairros mais tradicionais da capital do Amazonas: “Praça 14 de Janeiro, com cento e quarenta anos de existência, O Quilombo do Barranco de São Benedito nasceu com a reunião da família de Maria Severa Nascimento Fonseca, ex-escrava vinda do estado do Maranhão no final do século XIX, hoje seus descendentes se subdividem em 145 famílias. Apesar de um passado marcante e de muitas tradições, a comunidade só é reconhecida a partir de 2003, com o decreto 4887, e oficializado pela Fundação Palmares e Ministério Público Federal em 2014.
Segundo a descendente da matriarca Jamily Silva, o decreto veio tarde para impedir a invasão do quilombo, pelos estabelecimentos comerciais. Relata ainda, que a pressão contra a cultura e os remanescentes quilombolas vem de longa data, com a perseguição e derrubada do terreiro de umbanda, pelo projeto de urbanização do bairro, desencadeado entre 1963 e 1964, governo de Plínio Coelho. Local onde ocorriam as celebrações em honra à Nossa Senhora da Conceição. O projeto de urbanização desconfigurou o quilombo, e sua área de preservação dos costumes negros, em nome da evolução comercial do bairro, com a instalação de inúmeras lojas de materiais automotivos.
Para o mestre Vinícius Alves da Rosa, “a invisibilidade do grupo (de remanescentes quilombolas) (…) suscitou lutas protagonizadas na busca da visibilidade, pela reivindicação e consciência da identidade coletiva”. Espaços sociais e de lazer, como o “Jaqueirão” e o “Romeirinho”, foram mostras das perdas ocorridas pela comunidade ao longo de sua existência. Tais eventos são mostras das barreiras, mas também da luta de superação dos remanescentes, contra o preconceito, a pressão da urbanização e especulação imobiliária, em um território de origem historicamente comprovado.
Aos desafios relacionados, soma-se os da saúde onde observa-se um número considerado de octogenários na comunidade, bem como a prevalência de doenças que afetam de forma particular as populações negras, como a anemia falciforme. Esse contexto exige uma atenção primária e especializada que leve em conta não apenas as condições de saúde específicas dessa população, mas também o perfil demográfico, cultural e histórico de suas descendências. Apesar de a população estar dispersa no atendimento oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS), é urgente a implementação de um planejamento estruturado que considere as especificidades culturais e de saúde da comunidade no território.
Apesar disso a área mantida pelo quilombo é ambiente de intensas manifestações culturais, contando com a participação inclusive daqueles quilombolas que venderam seus terrenos para viverem em outros bairros, mas que não deixam de prestigiar suas tradições. A festa centenária de São Benedito, é exemplo desta resistência cultural, significado de respeito pelas raízes. Celebrada há mais de 50 anos, popularizada por Tia Lurdinha, até sua morte, sendo transferida a sua sobrinha Jacimar Silva, a Tia Cimar, falecida em 2009. A partir de 2010 passou as mãos da Sra. Jamily Silva, mantenedora das tradições até então.
O Dia da Consciência Negra, celebrado no dia 20 de novembro, é um marco para refletir sobre a luta do povo negro no Brasil. A data não deve ser apenas uma comemoração, mas também um momento de reflexão sobre as condições de vida das comunidades negras, sua participação nas decisões políticas e a implementação de políticas públicas que realmente atendam às suas necessidades. A luta por representatividade política e social é uma das batalhas centrais desse movimento, que continua até hoje.
Traçar um panorama das lutas sociais no Brasil, desde a República até os dias atuais, destacando como as classes populares, especialmente os negros e os pobres, têm sido marginalizadas nas decisões políticas e sociais. Destacando criticamente às manipulações de poder, tanto internas quanto externas, aponta para a necessidade de uma verdadeira transformação na forma como a sociedade brasileira encara a questão da representação e da justiça social. Essa análise não apenas revisita a história, mas também convida à reflexão sobre as dinâmicas atuais de poder e a luta contínua por uma sociedade mais justa e igualitária.