Ao dar à luz a uma criança as mães não devem matar as outras mulheres presentes nelas para que a “mulher-mãe” nasça.
“Não existe amor mais verdadeiro do que do amor de mãe”, “Mãe é uma só”, “O sorriso do filho é o que toda mãe mais quer”, “Ser mãe é o emprego número um”, são algumas das frases comuns nos cartões de presentes, lojas e propagandas para o mês das mães. Celebrar um dia para quem nos deu a vida e faz inúmeros sacrifícios pela sua família é no mínimo justo. Mas será que estamos realmente pensando sobre a maternidade ou apenas reforçando uma idealização inalcançável e favorecendo um comércio que reforça estereótipos? (Retratando mães como super-heroínas que sozinhas dão conta da família, trabalho, casamento, filhos, casa). Afinal, sejamos sinceros, pensar numa rotina com todas responsabilidades somada a expectativa de estar sempre num espírito acolhedor e com palavras de sabedoria e amor incondicional, sempre pronta para fazer um sacrifício não parece muito fácil ou divertido, parece mais um eterno fardo de pressão, culpa e abdicação.
Não há registros específicos da origem da tradição do dia das mães. O que eu encontrei foi a dissertação “Alegria de Instantes: as festas de comemoração e laços familiares” da autora Daniela Almeida de Machado, onde de acordo com autora existem poucos registros de comemorações similares na Grécia Antiga (período Helenístico) de festas celebrando as mães das colheitas no início da primavera, seguidos por tradições da Inglaterra do século XVII em que o quarto domingo após a quaresma era festejado a “igreja mãe” (onde fiéis deviam ir à igreja onde foram batizados demostrar e compartilhar sua fé na igreja católica e também confeccionavam um bolo doce junto as duas mães madrinhas de batismo)nessa data a classe trabalhadora costumava viajar para casa de suas mães e irem a igreja da família. E ainda segundo o estudo realizado por Machado, foi em 1914 nos Estados Unidos que ativista Anna Jarvis junto a outras mulheres pressiona o governo estadunidense a criar a data para comemorar e refletir sobre o papel das mães na família e sociedade. Como podemos observar com o passar do tempo a data foi criando novas simbologias e diferentes maneiras de comemoração. Hoje não só os católicos que comemoram a data, as famílias mudaram suas configurações e significado de ser mãe também mudou. Mas será que a pressão social sobre ser mãe também mudou?
Esses dias ao almoçar numa churrascaria vi uma família gigantesca (deviam ter umas 30 pessoas naquelas mesas) comemorando um aniversário. Todos brindavam, conversaram e riam alto, mas ao final da mesa com um certo distanciamento de todos havia uma mãe sozinha segurando um neném e balançando tentando faze-lo dormir. Ela ficou ali por quase 40 minutos, sem ninguém se quer levar uma taça para mãe. Ela estava sozinha, ela não fazia parte daquela comemoração, ela era simplesmente a mãe. Sem fome, sem cansaço, sem sede, sem estar irritada, era só a mãe. Eu não estou julgando aquela família ou aquelas pessoas, mas pensando na solidão e nas responsabilidades impostas para aquela mulher. Na conversa com uma amiga que é mãe solo, ela relatou que ama as duas filhas, mas não aguenta mais ser mãe todos os dias, que não suporta mais trabalhar exaustivamente no shopping e nunca poder sair para se divertir sem levar as crianças ou ser julgada “ É complicado, quando falo que preciso de um tempo só para mim me respondem que então eu deveria ter sido mãe. O fato de eu ter suas filhas não precisam matar as outras mulheres que existem em mim. E o pior que ninguém pergunta isso para o pai”. Ela também conta que tudo é julgado desde o seu cansaço até o que ela escolhe que os filhos vistam. “ Me cobram um estilo de vida e de maternidade que não corresponde a minha realidade mas não cobram nada do pai”. O peso das coisas que ninguém conta sobre a maternidade é cada dia mais intenso principalmente para as mães de primeira viagem.
O melhor presente que podemos oferecer para todas as mães (inclusive as nossas) é olhar para elas como seres humanos, com sonhos, sentimentos (não só os sentimentos bonitos) cansaços, medos, raivas e principalmente participar da vida das crianças que nos cercam. Contrate mães, entenda as crianças nos ambientes ( crianças choram, gritam e nem sempre agem racionalmente), ofereça tempo com a criança para que mãe descanse, cobre igualmente do pai, pense paternidade, crie ambientes que aceitem crianças ( ambientes que proíbem crianças cerceiam mulheres). Mães são gente, elas não precisam da santificação mito menos das cruz. Respeito, empatia, mudança estruturais nas relações famílias e desconstrução do machismo na sociedade serão os melhores presentes possíveis para esse dia.