Como já dizia o geógrafo brasileiro Milton Santos sobre nossa sociedade, “A classe média não quer direitos, ela quer privilégios, custe os direitos de quem custar”. Essa frase consegue explicitar nossas mazelas, enquanto uns tem muito, outros não tem nada ou quase nada. Mesmo que em 1988 tenha sido promulgada a Constituição Cidadã, muitos brasileiros não podem ser considerados cidadãos, pois não tem o básico de direitos que são garantidos nela, ou que pelo menos deveriam ser.
A constituição tem em seu primeiro artigo que os fundamentos da República Federativa do Brasil são por exemplo a cidadania e a dignidade da pessoa humana. Entretanto quando estamos nos centros comerciais dos bairros, quantas pessoas estão pedindo dinheiro na rua? Quantas delas estão descalças e pelo menos 10kg abaixo do peso? Quantas delas são crianças? Quantas delas são negras? Essa dignidade é para quem? Quando parte da população não tem direito a alimentação três vezes por dia, a uma escola de qualidade, a saúde, a moradia, ou seja, o mais básico, todos aqueles que têm são privilegiados. É nesse ponto que os direitos viram privilégios.
Um dos grandes problemas é que esses privilegiados além de gostarem da posição que ocupam na sociedade e quererem sempre mais, acham que fazer a vida desses que não tem os mesmos direitos melhor é apenas dever do Estado. Assim, ficam sempre na posição agradável de não achar que carregam essa culpa nas costas, mantendo-se sempre confortável com seus privilégios e sempre que têm seu status ameaçado tentam ao máximo destruir essa ameaça apontando o privilégio do outro.
Foi assim e é assim até hoje com as ações afirmativas. Toda vez na mesma época do ano, o momento do sisu, as cotas para negros e pobres são sempre atacadas como se fossem o maior dos privilégios. Algo que foi criado para reparar a dívida histórica que temos com essas pessoas e tentar diminuir a distância de oportunidades que existe entre os participantes do ENEM é acusado sempre de privilegiar quem nunca teve nenhum privilégio na vida. O grito para acusar incomoda, mas o silêncio para ajudar é ensurdecedor.