Educação infantil é prejudicada durante a pandemia

Escola pública de Aracaju está fechada e não oferece atividades para crianças da educação infantil- Foto: Jamili Vasco/ANF

A psicóloga clínica e escolar Camila Barreto Cavalcante explica os impactos na educação das crianças devido à pandemia do novo coronavírus: “A interrupção no ensino e, posteriormente, a mudança da educação presencial para à distância causaram impactos no ensino das crianças muito além do processo de aprendizagem”. Segundo a psicóloga, isso acontece por mais que as escolas e instituições busquem aprimorar ferramentas e novos métodos, já que envolve aspectos emocionais e sociais da criança. “E quando o retorno do contato social ocorrer, essas crianças vão chegar com outras demandas. Dentre elas, níveis de linguagem, de socialização e aspectos cognitivos,” conclui.

Na quinta-feira, 10/09, o governador de Sergipe, Belivaldo Chagas, anunciou a reabertura de algumas atividades educacionais: cursos livres e atividades extracurriculares podem funcionar com 50% da capacidade a partir do dia 14 de setembro. No entanto, alunos com menos de 10 anos não podem comparecer presencialmente às instituições de ensino. Além disso, atividades em escolas regulares e cursos pré-vestibulares estão proibidos.

As crianças da educação infantil da Escola Municipal de Ensino Fundamental Zalda Gama, localizada na comunidade Veneza II, Aracaju (SE), estão sem aulas presenciais desde o início da pandemia e sem acesso às atividades do programa da prefeitura Escola vai até você. Esta situação tem preocupado alguns pais que temem prejuízos no aprendizado dos filhos.

Sem aulas presenciais, Maria Fontes desenvolve atividades para a filha fazer em casa- Foto: Jamili Vasco/ANF-

Segundo Maria Carine dos Santos Fontes, 36, desempregada e mãe de Ana Clara dos Santos Fontes, 6, que estuda na Escola Municipal Zalda Gama, a filha gosta de estudar, mas a instituição de ensino não tem oferecido suporte com atividades pedagógicas online ou apostilas. “Ela chora muito querendo ir para escola. A professora até liga e fala com ela. Outras escolas passam tarefas. Eu não sei por que a dela não”. Maria Carine conta que a professora criou um grupo de Whatsapp para falar com os alunos e mandar vídeos educativos. “Minha filha quer estudar, mas não tem como. Eu acho que ela vai desaprender tudo. Ela estava aprendendo a ler e já soletrava as letras antes da pandemia. Agora, vai ficar difícil, vai ter que começar tudo de novo para aprender a ler,” conclui.

Suiane Alves Rosa, professora de Ana Clara Fontes, confirma que não estão sendo disponibilizadas atividades impressas para as crianças da educação infantil no Zalda Gama, mas que ela está criando vídeos de cunho educativo e publicando no grupo de Whatsapp criado por recomendação da coordenação.

“Eu faço os painéis, as montagens do vídeo e meu esposo grava todo o material. Compartilho esses vídeos no grupo. Não estão todos os alunos lá porque muitos deles não têm condições de ter internet ou celular. Além disso, são poucos os alunos que estão interagindo no grupo”. A professora conta que sente falta da sala de aula, assim como os alunos que até mandam áudios dizendo que estão com saudade e querem voltar logo para brincar e abraçá-la. “Eles são os primeiros a dizer que vão abraçar, mas temos que colocar a saúde em primeiro lugar. Temos que proteger as nossas vidas e a das crianças,” enfatiza Suiane Rosa.

Carlos Daniel Santos Oliveira, 7, estudante do 2º ano do ensino fundamental do colégio Zalda Gama, está recebendo as atividades impressas em casa quinzenalmente. Sua mãe, a dona de casa Leonice Santos de Oliveira, 25, auxilia o filho a fazer as atividades. “Eu tenho muito medo de levar meus filhos para a escola agora com essa pandemia. Eu só deixaria eles voltarem se tivessem máscaras, álcool em gel e distanciamento social,” explica. Apesar disso, Leonice acrescenta que o filho mais novo, Carlos Eduardo Santos de Oliveira, 3, estudava na creche e não aguentaria ficar muito tempo com a máscara durante o horário escolar.

“Eu só deixaria eles voltarem para a escola com máscaras, álcool em gel e distanciamento social”, afirma Leonice Oliveira- Foto: Jamili Vasco/ANF

A manicure Thaize Ferreira, 27, mãe de Cecília Mireli Ferreira Dantas, 8, outra estudante do Zalda Gama, também ajuda sua filha nas atividades disponibilizadas pela escola. Quando precisa trabalhar, pede a outros familiares para auxiliar a filha nas tarefas. “É a quinta atividade que eu recebo desde a paralisação das aulas. Quando eu posso, ajudo. Quando não, a tia ajuda ou ela vai para banca (reforço escolar). Eu acredito que na escola minha filha aprende mais porque a professora tem o conhecimento para ensinar melhor que a gente em casa,” alega Thaize. Ela conta que se a escola voltasse, levaria a filha seguindo todas as precauções e cuidados. “Ninguém sabe quem está hoje em dia com o coronavírus. Ela voltaria usando máscara e álcool em gel”, declara.

Thaize ensina as tarefas de sua filha quando não tem clientes para atender – Foto: Jamili Vasco/ANF

Para a pedagoga Daniela Nascimento Santos Passo, o afastamento das crianças do ambiente escolar por causa da pandemia da Covid-19 mostrou como os pais são necessários para auxiliar no aprendizado dos filhos e o quanto a família estava distante da educação das crianças. “As escolas da rede particular, mesmo enfrentando dificuldade, conseguiram encontrar uma forma através das tecnologias para retornar às aulas de modo remoto. Infelizmente, o mesmo não aconteceu em todas as instituições de ensino público. Existem escolas que não voltaram às aulas em nenhuma plataforma digital”, relata a pedagoga.

Para a professora Polyana Bittencourt, da Universidade Tiradentes, a  educação é um dos caminhos para reduzir as desigualdades sociais e econômicas. Além disso, a educação formal possibilita não somente a formação cidadã, mas também o aperfeiçoamento profissional. “Uma pena que as desigualdades sejam absurdas. Há pesquisas que mostram que pobres e pretos têm menos chances porque o problema é estrutural. A pandemia acelerou a desigualdade existente há séculos. Há várias pesquisas que comprovam essa desigualdade. Diariamente a imprensa mostra isso”, revela a professora.

De acordo com a  Lei Nº 12.796 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, a  educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança de até cinco anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.

Esta matéria foi produzida com apoio do Fundo de Auxílio Emergencial ao Jornalismo do Google News Initiative: https://newsinitiative.withgoogle.com/intl/pt_br/journalism-emergency-relief-fund/