Encontro cultural celebra o “Dia Mãe Beata de Yemanjá”

Crédito: Paulo Santos

A partir deste ano a Rede Afroambiental instituiu o “Dia Mãe Beata de Yemanjá”, data de seu aniversário, 20 de janeiro, como um marco de luta pela cidadania cultural dos povos e comunidades tradicionais de matriz africana. A mãe de santo baiana faleceu em 2017 e foi uma defensora dos direitos humanos, com ações destacadas pela preservação do meio ambiente e da cultura afro brasileira.

Para celebrar a data, a Inzo Matamba Dilewi Filha promoveu um encontro cultural nesta sexta-feira (20), em Itacimirim, Camaçari, Bahia com lideranças de entidades socio culturais, comerciais e religiosas, além de familiares da homenageada. Em Porto Alegre e no Rio de Janeiro a Rede Afroambiental também realizou ações comemorativas.

Coordenado por Nengwa Matendesi, Mãe Elza, liderança da Rede Afroambiental na Bahia, o evento valorizou a história oral de origem africana com a leitura de um conto do livro “Itans dos Mais Velhos” do Babalorixá Ajalah Deré,Prof. Ruy do Carmo Póvoas. O texto foi interpretado por Kota Negra Magna, umbandista, de Camaçari, militante da Rede de Mulheres Negras, Membro do Grupo Operativo da Ouvidoria Externa da Defensoria Pública da Bahia e Conselheira Estadual de Cultura.

Crédito: Divulgação

Dentre as lideranças locais destaque para Mestra Nildes Bomfim, do Grupo Cultural Espermacete, de Barra de Pojuca que apresentou a Oficina de Trançado de palha da piaçava, Kota Gomonayê Jaciara Menezes Carvalho, filha de Tata Ricardo do Terreiro de Lembá, Presidente da Associação Beneficente Mãe da Terra, da comunidade do Beco da Cebola, em Monte Gordo, e Janicelia do Nascimento, líder da comunidade Beira Rio, Rua da Floresta, e Roniere Pereira que atuam com reciclagem , educação ambiental e
coleta seletiva em Itacimirim.

O samba de roda, a exposição do Coletivo de Artes Kitanda Traz e o lanche natural integraram a programação. Kota Gomonayê Jaciara tem planos para atuar na comunidade com Educação Ambiental no manguezal de Jacuípe e promover a reciclagem de resíduos. “ Eu
quero deixar para meus netos, passar para as gerações para cuidar da comunidade, cuidar da Terra, das crianças, dos velhos.. A gente de candomblé precisa da natureza, do mangue, do rio, do ar. Tudo que agente faz é com a preservação.Se você não preserva lá na frente o que você vai deixar para seus netos?” afirmou.

Legado de Mãe Beata
Beatriz Moreira Costa, a Mãe Beata de Yemanjá nasceu em 20 de janeiro de 1931, em Cachoeira, na Bahia, era neta de portugueses e africanos escravizados conduzidos ao Brasil. Ela se estabeleceu alguns anos depois em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Falecida em 27 de maio de 2017 foi escritora e artesã, desenvolveu trabalhos na defesa do meio ambiente, dos direitos humanos, da educação, da saúde, e no combate ao sexismo e ao racismo.

A matriarca sempre se posicionou a favor da justiça social, participou de atividades de combate à intolerância religiosa, de prevenção das DSTs/HIV/Aids e câncer de mama, à violência contra a mulher, à discriminação racial e de gênero. A mãe de santo também foi conselheira do MIR-Movimento Inter-Religioso, membra do Unipax, integrante do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher, presidente de honra da ong CRIOLA, organização de mulheres negras que atua contra o racismo, o sexismo e a violência contra a mulher e integrante do ICAPRA, Instituto Cultural de Apoio e Pesquisa das Religiões Afros – espaço para difusão das heranças e tradições dos povos afro brasileiros.

Ela fundou o terreiro  Ilê Omiojuarô , em Miguel Couto, em Nova Iguaçu e é reconhecida por sua ativa militância em favor da liberdade religiosa. Em 2014, foi homenageada pela  escola de samba   Garras do Tigre , no  Carnaval de Nova Iguaçu .

Crédito: Divulgação

Representatividade

O filho de Mãe Beata, o artista plástico Aderbal Ashogun Moreira, coordenador da RedeAfroambiental participou virtualmente do encontro, direto de Portugal,onde reside. Ele destacou a importância da matriarca na luta política pela preservação ambiental praticada pelas religiões de matriz africana e pelo respeito a liberdade religiosa, lembrando a atuação firme dela no Encontro ECO 92, no Rio de Janeiro, no “Planeta Fêmea”. Já o filho mais velho e sucessor espiritual, Babá Adailton Moreira, do Ilê Omiojuaro, também
conversou com os participantes virtualmente, agradecendo as homenagens.

Participou também do evento Alcides Jorge Carvalho dos Santos, Bàbá Alcides D’Oxalá,Babalorixá do Ilé Òrìṣà Nlá Àṣẹ Ọbalodó, Conselheiro Estadual de Saúde, Integrante do Comitê Técnico da Saúde da População Negra – Sesab e Coordenador dos Homens de Axé da RENAFRO Saúde – Lauro de Freitas Representando o Conselho Municipal de Política Cultural de Salvador, a presidente Ìyá Márcia Ọ̀gún, Ìyalọ̀ríṣá do Ìlẹ̀ Àṣẹ Ẹwà Ọ̀lódùmarè prestigiou a homenagem.

Ela integra a Rede de Mulheres de Terreiro da Bahia, é coordenadora da RENAFRO, Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde, Núcleo Lauro de Freitas – BA, integra também a RENADIR, Rede Nacional da Diversidade Religiosa, do Comitê InterReligioso da Bahia e o GT de Terreiros do MPT.

Marcou presença ainda Ailton Ferreira, sociólogo, assessor especial da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social, coordenador da ong Instituto Reparação e Ogã de Oxaguian da Casa de Oxumarê. Ele saudou a trajetória de Mãe Beata e enfatizou o papel dos povos tradicionais e das religiões de matriz africana no combate ao racismo e à intolerância religiosa vigentes no Brasil. Elias Oliveira da Conceição, filho de mãe Nicinha de Nanã – Iyalorixá do Terreiro Olufanjá, de onde é Ogan de Nanã, membro Coordenador do Comitê
InterReligioso da Bahia; secretário da Associação de Preservação do Axé Bamboxê ,Terreiro Pilão de Prata também esteve entre os convidados.

Crédito: Claudia Correia

Rede afroambiental : articulações nacional e internacional

A Rede Afroambiental é formada por comunidades que utilizam ferramentas transversais da ecologia, da cultura e do conhecimento, passadas através de gerações por mestres e mestras, para transformar olhares e ações sobre o meio ambiente. Entre os fundamentos estão o resgate de uma forma de vida sustentável e a cultura como pilar da educação.

Há trinta anos em movimento, a rede nasceu pela ação, incidência, reparação, denúncia, proposição e discussões apresentadas pelas lideranças culturais de matriz africana e do movimento inter-religioso na ECO92, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento.

Em novembro de 2022, a Rede promoveu com recursos próprios o Encontro Rio +30 que elaborou uma Carta Aberta contendo propostas para valorização da cultura e a preservação ambiental. O documento foi entregue em Genebra no Encontro de
Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas-ONU, na Cúpula do Egito na Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas e ao governo de transição no Brasil.