Um escritor inglês escreveu um conto, “A modest proposal,de Jonathan Swift, no qual sugeria uma forma inusitada de acabar com a praga da criminalidade juvenil que havia em seu país. Ele sugeria que se fizesse ensopado das crianças pobres, maltrapilhas, que cometiam crimes pelas ruas de Londres, no século 18.
Segundo ele, isso possibilitaria resolver o problema da fome dos pobres honestos, assim como diminuir drasticamente a criminalidade.
O texto, antes que alguém ache a ideia sensata, aviso que é uma paródia, uma piada irônica, do mesmo autor de “As viagens de Gulliver”. Através dele, o escritor fazia uma crítica aos políticos e endinheirados de seu tempo, sobre como resolver problemas sociais, na Inglaterra que estava entrando na Revolução Industrial. Sim, já havia “Bolsonaros” naquela época.
Se Swift estivesse vivo e soubesse o que se passou na Comissão de Justiça, no Congresso brasileiro, favorável à admissibilidade da PEC 171/93, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos, certamente faria um texto muito mais forte do que o citado.
Talvez, primeiramente, mandaria tirar a palavra “Justiça”, daquela comissão parlamentar. Pois ela não faz jus a tal palavra. A começar pelo senhor Eduardo Cunha,que com tantos processos legais como réu em suas costas, não teria cacife moral para sequer proferir tal palavra em seus lábios.
Segundo, lembraria que tal comissão não deveria se chamar “de Justiça”. Mas, sim, de “Chantagem e Mentira”. Pois chantagem é o que ela e seus componentes fazem. Chantageiam e mentem para os eleitores, ao dizer que a redução da Maioridade Penal é a solução para os crimes no Brasil. Sabem que não é. Mas precisam se eleger na base da mentira.
Chantagem é o que fazem, para votar ou não tal projeto, de olho em cargos e verbas futuramente.
E chantagem das mais graves fazem também com o povo pobre oprimido, o qual será a principal vítima das punições legais decorrentes dessa redução etária. Assim como foi da de 21 para 18. Os filhos de ricos que cometeram crimes não pagaram por eles, como as estatísticas provam, para quem quiser saber.
Confesso que quando li o texto da “sopa de menores pobres”, tive estranheza e nojo.
Porém, sinto muito mais nojo dessa maioria hipócrita do Congresso Nacional. Que rouba no atacado, bilhões de dólares do povo. Mas que finge punir quem furta para enganar a fome, no varejo.
Tenho vergonha, absoluta e plena vergonha, desses mentirosos, corruptos, racistas políticos brasileiros, que de forma medíocre aprovaram a possibilidade da redução da Maioridade Penal ser aprovada. E mais: temo saber quais serão seus próximos passos. Pois a aprovação foi somente um teste de força, dos setores mais reacionários do Congresso Nacional. Como saíram vitoriosos nesta batalha, os congressistas que giram em torno das ideias de Eduardo Cunha e Bolsonaro certamente irão abrir suas caixinhas de maldades, com projetos de leis mais racistas, homofóbicas, e muito provavelmente atacando os direitos sociais e sindicais.
É preciso, sim, que exista uma rede de proteção aos jovens que cometeram ato infracional, e sobre esse ponto existe ainda uma grande carência de esforço do Poder Legislativo e Executivo, bem como, de uma rede capaz de acolher, cuidar das mães, irmãos, filhas que perdem os seus pela violência policial, pelas condições degradantes dos subempregos, pela falta de segurança alimentar e nutricional, pelas doenças causadas pelas péssimas condições de vida aos quais estamos submetidos.
Para tanto, fortalecer a proteção social, incentivar projetos de cultura, esporte, cursos profissionalizantes e uma escola pública de qualidade são estratégias muito mais eficientes para evitar que os jovens se aproximem do crime. Sabemos que o poder não deixa vácuos, de modo que sempre que o Estado deixa de se fazer presente — a exemplo do que faz em favelas e comunidades pobres — deixa espaço para que outros agentes tomem seu lugar.