Pode ser uma sinal de capitulação diante da realidade, ou um sinal trocado para o país acreditar na sua sinceridade, o fato é que Jair Bolsonaro finalmente atualizou seus dados biográficos nas redes sociais e não se apresenta mais como “capitão paraquedista do Exército brasileiro” e “candidato à reeleição com o número 22”. Desde ontem ele “é o 38º Presidente da República Federativa do Brasil”, assim mesmo com o verbo no “presente histórico” e não no passado “foi o 38º”. Aí reside a sutileza.
Mas como a família Bolsonaro nunca demonstrou profundidade cognitiva para expressar sutilezas, podemos crer que ele continua presidente do Brasil, apesar de Luís Inácio Lula da Silva ocupar o espaço há duas semanas. O espaço de tempo é curto e admite ainda devaneios conspiratórios semelhantes ao que alimenta os sonhos dos bolsonaristas-raízes dentro e fora do país. Por falar nisso, o retorno e prisão do ex-ministro Anderson Torres neste sábado representou significativa baixa no contingente exilado do ex-presidente.
A situação tende a se agravar com maior celeridade do que agora porque os investigadores vão apertar e espremer o ex-ministro e ex-secretário de Segurança do Distrito Federal até encontrar as evidências de que atuou de fato na desmobilização do aparato de segurança para tornar factível e bem sucedida a operação terrorista do domingo 8 de janeiro em Brasília.
Não há margem para dúvidas a esse respeito, já que as medidas estão todas no papel e no computador, inclusive a mais grave das medidas: o decreto de Estado de Defesa no TSE rascunhado e guardado em sua casa com o objetivo de alterar os resultados das eleições. Resta a Anderson Torres confirmá-las e assumir a responsabilidade (culpa) ou passá-la adiante para o governador afastado Ibaneis Rocha e no caso do decreto responsabilizar o principal interessado – Jair Bolsonaro.
Abro um parágrafo para lembrar que o governador já prestou depoimento, quando tentou culpar instâncias subalternas à sua autoridade pelo descalabro, alegando ter confiado plenamente nos informes recebidos. No entanto, ficaram lacunas no depoimento de Ibaneis sem explicações aceitáveis, sendo a maior delas a vinda de cem ônibus com pró-Bolsonaro para invadir os prédios da Praça dos Três Poderes sem que a polícia tenha prestado a atenção devida.
No cargo de secretário de Segurança de Ibaneis Rocha, Torres exonerou toda a cúpula do policiamento capaz de reprimir o terrorismo e entrou em férias quase instantaneamente, viajando para a Flórida, onde esteve com Jair Bolsonaro, que dias depois foi incluído no inquérito do golpe em função do vídeo postado dia 10 em que volta a acusar o TSE de fraude nas eleições.
A alteração na biografia de Jair Bolsonaro nas redes sociais, de aparência inocente, pode significar um movimento de defesa no xadrez do golpe. Pode não ser nada demais, como disse no começo, mas pode sinalizar a entrada do jogo em novo patamar, onde Bolsonaro reconhece a condição de “presidente no exílio” e compra a briga no nível internacional. Nesta hipótese, é recomendável a polícia recomendar sua prisão e o ministro Flávio Dino pedir a extradição ao governo norte-americano.