Cerca de 350 famílias, que fazem parte da Ocupação Recanto da Vitória, ao lado do pedágio CIA Aeroporto, entre Salvador e Lauro de Freitas -Ba, desde 2020, receberam ordem de despejo, com data limite para pernacerem no local até 30 de novembro.
De acordo com representantes da ocupação, o interessado pela ordem de despejo é um Deputado Federal, do União Brasil, eleito pela Bahia, que alega ser proprietário da área, juntamente com sua família, argumento que consta nos altos do processo.
Segundo alguns moradores, o despejo fere a DPF 828, mas o Governo Estado da Bahia e as Prefeituras de Salvador e de Lauro de Freitas, não se manifestaram até o momento.
A DPF diz que em caso de despejo, é necessário seguir etapas de garantia dos direitos das famílias, como auxílio aluguel, e nenhuma delas foram seguidas .
A coordenação do Movimento de Trabalhadores Sem Teto considera o despejo irregular, mesmo o processo transitado em julgado.
“(a) Os Tribunais de Justiça e os Tribunais Regionais Federais deverão instalar, imediatamente, comissões de conflitos fundiários que possam servir de apoio operacional aos juízes e, principalmente nesse primeiro momento, elaborar a estratégia de retomada da execução de decisões suspensas pela presente ação, de maneira gradual e escalonada; (b) Devem ser realizadas inspeções judiciais e audiências de mediação pelas comissões de conflitos fundiários, como etapa prévia e necessária às ordens de desocupação coletiva, inclusive em relação àquelas cujos mandados já tenham sido expedidos. As audiências devem contar com a participação do Ministério Público e da Defensoria Pública nos locais em que esta estiver estruturada, bem como, quando for o caso, dos órgãos responsáveis pela política agrária e urbana da União, Estados, Distrito Federal e Municípios onde se situe a área do litígio, nos termos do art. 565 do Código de Processo Civil e do art. 2º, § 4º, da Lei nº 14.216/2021; (c) As medidas administrativas que possam resultar em remoções coletivas de pessoas vulneráveis devem (i) ser realizadas mediante a ciência prévia e oitiva dos representantes das comunidades afetadas; (ii) ser antecedidas de prazo mínimo razoável para a desocupação pela população envolvida; (iii) garantir o encaminhamento das pessoas em situação de vulnerabilidade social para abrigos públicos (ou local com condições dignas) ou adotar outra medida eficaz para resguardar o direito à moradia, vedando-se, em qualquer caso, a separação de membros de uma mesma família.”
Anota este CAOPJDH que o item “a” já se encontra em funcionamento no Estado do Paraná, em que o Poder Judiciário, após intervenção do MPPR, criou em 23 de outubro de 2019, a Comissão de Conflitos Fundiários (CFF) do TJPR (comissão.fundiarios@tjpr.jus.br), que tem buscado soluções consensuais para os conflitos fundiários urbanos e rurais, seja na fase pré-processual, seja após a propositura da ação judicial.
O objetivo principal do órgão, composto por três juízes, três desembargadores e uma servidora do Tribunal, é promover o diálogo entre os interessados e realizar visitas técnicas nas áreas em litígio, com a elaboração de relatório circunstanciado sobre as condições da ocupação e da comunidade, que servirá de subsídio para uma eventual composição entre as partes ou para a decisão a ser proferida pelo juiz da causa.
Esse mecanismo judicial está à disposição dos (as) Colegas de MPPR, que podem solicitar ao juízo responsável pela ação de reintegração de posse que encaminhe os autos à citada Comissão do TJPR.
O item “b” se mostra coerente com o conteúdo do Ofício Circular Conjunto nº 02/2022 da PGJ e da Corregedoria-Geral do MPPR, no sentido de que os Membros do MPPR participem das inspeções realizadas pela Comissão de Conflitos Fundiários do TJPR. Esse ato judicial deve ser realizado em todas as fases processuais – até mesmo durante o cumprimento de sentença já transitado em julgado – e não é substituído pela audiência de mediação.
Por fim, o item “c” consagra o direito à relocalização, que este CAOPJDH por diversas vezes já noticiou aos Colegas de MPPR, bem como determina que devem ser os representantes ouvidos e cientificados do cumprimento das medidas de reintegração de posse, o que deverá ser feito em prazo minimamente razoável.
O direito à relocalização, garantido pela Resolução nº 10 do Conselho Nacional de Direitos Humanos e pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos, visa a garantir o encaminhamento das pessoas em situação de vulnerabilidade social – leia-se, todas as pessoas sem acesso à moradia ou terra – a locais com estrutura para dignamente receber as pessoas despejadas, de modo que as famílias sempre deverão ser mantidas unidas.
Logo, enviar pessoas para espaços inaptos à moradia, tais como ginásios ou escolas, não satisfaz esse requisito jurídico imprescindível para o cumprimento das ordens de reintegração de posse, nos termos do Direito Internacional dos Direitos Humanos recepcionado pelo Brasil e da decisão do STF em comento.