Uma coisa é certa: os moradores da cidade do Rio de Janeiro – ou a maioria – têm contato diário com a violência. Porém, nas favelas essa proximidade já é quase naturalizada, principalmente pelo olhar da grande mídia. Noticiar que houve tiroteio no morro não é novidade, mas só se torna um mar de comoção quando atinge o ir e vir de quem está fora do nosso perímetro.
Isso pode ser facilmente entendido quando se sabe que a favela é um lugar que já nasceu sob o estigma da violência, fruto da negligência do Estado lá atrás, no final do século XIX. Mesmo se deparando com ela diariamente, os moradores não conseguem se acostumar – e com toda a razão – com esse transtorno que afeta seu bem-estar e seu ir e vir, um direito que está na Constituição.
O medo da bala perdida se tornar achada faz com que as pessoas fiquem ilhadas e escondidas nas suas próprias casas. Dias ficam estagnados por uma situação que foge ao nosso controle. Assim, muita gente acredita que favela e violência são sinônimos, mas se sabe que, muito embora haja esta inegável marca de nascença, não se pode generalizar pessoas e lugares, como acontece há tempos.
É muito comum ouvir e ler por aí: “Ah, mas a população do morro tem que pedir o fim dessa situação!” ou “A violência do morro só acontece porque favelado deixa!”. Mas só quem mora aqui dentro conhece a realidade e sabe que essa equação é muito mais complexa do que meras palavras de indignação momentânea. O fim dela não depende do morador da favela. O morador é só mais uma vítima de uma violência que vem de cima e de fora do morro.
Àqueles que pedem o famigerado Estado mínimo, os convoco a morar numa favela: aqui o Estado é mínimo desde sempre.