Uma avó com as marcas dos anos vividos em seu rosto. Uma mãe que amamenta o filho como pode e outra que carrega o bebê a tiracolo em meio ao dia de labuta. No fundo, galhos e raízes de árvores que contam uma história sobre o ciclo perene de famílias lideradas por mulheres, nas quais filhas encaram a maturidade de virar mães, que depois tornam-se avós.

Esta é a imagem que estampará os muros de um conjunto habitacional da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) no Itaim Paulista, zona leste de São Paulo.

“Enraizadas apresenta a árvore em suas raízes, seu fruto e sua flor. Com uma poética que sugere não somente a beleza, mas também a dureza e secura de muitas partes desse processo. O ciclo. O eterno retorno. Cada criança que nasce é um ancestral que retorna. Estou aqui porque já estive em todas as partes”, detalha a artista da obra, Mimura Rodriguez.

O grafite começou a ser pintado ontem e deve levar cerca de 10 dias para ser finalizado. A obra ocupará uma área de 236,25 metros quadrados, dos muros do Bloco 04-B do Condomínio Vitória, na Rua Manuel Rodrigues Santiago, 88D.

Mimura explica que o local escolhido para a pintura também se conecta diretamente com a proposta poética da obra, já que os paredões do conjunto habitacional abrigam histórias duras de diversas mulheres periféricas que ali vivem.

Fruto de um relato pessoal, o desenho se conecta também com a história de sua própria criadora. Atuante no mundo das artes desde 2012, Mimura se tornou mãe em 2020, aos 31 anos e em meio à pandemia. Ao viver o maternar de sua filha e se conectar com a avó, que está morando com sua mãe, Mimura passou a ter as mulheres como o foco de suas obras.

“Tenho aprendido muito sobre a potência das mulheres e como sustentamos nossa comunidade em diversos aspectos, mesmo que estes não sejam tão valorizados quanto deveriam. Tento trazer a força da ancestralidade, essa que não é apenas sobre parentes que viveram há muito tempo, mas também sobre os que estão aqui conosco”, comenta a grafiteira, explicando que, em sua arte, é a esses elementos que busca dar visão e voz.

Mestiça – filha de mãe japonesa e pai uruguaio -, Mimura é periférica, nascida no bairro do Jabaquara, zona sul de São Paulo. Aos 34 anos, mora na cidade de Guarulhos, na Região Metropolitana. Além de ter a força das mulheres de sua família como inspiração, ela também enfatiza que o ambiente em que cresceu é sua raiz e seu norte em tudo o que faz na arte.

Além de grafiteira, Mimura é graduada em cenografia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Migrou do teatro para outras frentes das artes em 2017, quando começou a tatuar. Durante a pandemia, retomou trabalhos de xilogravura e tapeçaria. No ano passado, foi convidada a produzir murais com temática especial para o dia das mães e logo se apaixonou por pintar em escala cada vez maior e levar sua percepção de mundo para a rua.

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